Um dia ele quis ser passarinho e cuspir em todas as cabeças que visse de cima. Até que um dia ele virou pássaro. Mas quando esse dia chegou ele não quis mais cuspir em ninguém. Achou que havia alguma relação entre as cuspidas e seus desejos e sentado do alto de uma pedra ele refletiu sobre isso. Ele chegou à conclusão de que a vontade de cuspir nas pessoas devia ser a vontade impossível de sair do chão. Quando enfim saiu e alçou vôo já automaticamente a vontade passou.
E do alto da pedra viu o Sol refletir em suas asas com força, e sua luz branca junto com suas penas brancas se despejaram pelo céu azul e ele pensou que a liberdade é algo que nunca cansa. E assim ele subiu, subiu e subiu e ultrapassou as nuvens da esteira do horizonte, e subiu mais ainda, e mais, e mais, até que passou por todas as nuvens e encontrou a linha que divide o céu do espaço e sentiu que já não havia mais ar para se sustentar em vôo e pensou se tinha mesmo liberdade e sentiu o claustro da Terra e a gravidade o puxou com mais força como se fosse um abraço de saudade e era isso mesmo, o planeta sentiu falta dele e começou a cair, e caiu, caiu e caiu como se caiu num porre mágico, e ébrio seu cérebro começou a criar, e criou e criou e criou sem parar até que se extinguiu em pensamentos universais e quando o ar voltou a existir flutuou e rolou pelo vento até uma praia branca e deserta como suas penas plácidas.
E ao longe viu uma casa e caminhou (pois estava cansado de tanto voar) até a casinha. Era uma casa de madeira muito bonita e pintada de cores diversas que atraíam beija flores em busca de mel. E nesta casa entrou por um buraquinho redondo desenhado na parede de madeirinha e uma vez que entrou não conseguiu mais sair. E ele pensou de novo na liberdade e como era bom estar livre, e entristeceu a sua alma por saber-se livre porém preso numa casinha de madeira. E bateu nas paredes desta casa com todas as forças que tinha até que nada aconteceu então ele desistiu e sentou-se no canto de uma parede da casinha de madeira e se resignou em sua prisão.
Isso durou um tempo até que ele pensou. E ao pensar ele se sentiu livre novamente, e de tanto pensar teve a ideia de sair pela chaminé da casinha que ele não percebera antes de tanto que pensara no buraco. E lembrou que existem buracos onde se entra mas de onde não se sai, porém uma chaminé é algo que é feito para se sair. E se sentiu fumaça e fumaça ele virou, e assim saiu pela chaminé.
Uma vez em cima da casa ele teve vontade de voltar a ser gente. E sendo assim ele virou uma mulher. E pensou que como mulher sua liberdade seria restringida. Foi nesse momento que ele deu à luz a algo melhor que ele, e assim se sentiu livre de novo, pois se podia conceber então tudo ele podia. E deu um filho, depois outro, depois outro e depois mais outro e quando cansou ele (que era na verdade ela) começou a andar para longe. Percebeu então que os filhos o seguiam e viu de novo sua liberdade ir embora. Mas o amor era tanto que isso não importou.
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