quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Amélia

"Amélia, abra as perninhas , meu amor. Papai só quer ver uma coisinha... Papai precisa disso, Amelinha. Seja uma boa menina e abra as perninhas. Anda Amélia, anda, abre as pernas, que sua mãe já tá vindo. Amélia, porra, abre as pernas, se sua mãe te vir assim vai te botar no 'buraco'!"

Amélia olhava pra dentro. Todos os meninos olhavam pra fora. Aliás, todo mundo olhava pra fora, pois este é o normal. Mas Amélia olhava apenas para dentro. "Amélia! Como se soletra "adjacente"? Amélia! Acorda! Em que planeta você vive, Amélia?" E as crianças olhavam para fora, enquanto Amélia olhava para baixo, mas na verdade Amélia  olhava era para dentro. Em algum lugar dentro de si deveria haver alguma saída. Papai tava fora, Mamãe tava fora, e o buraco... Meu buraco era bem melhor do lado de dentro de mim mesma. "Amélia, mostra o buraquinho pro papai, vai? Só um pouquinho, Amélia, antes que sua mãe volte do supermercado." "Você quer leite, não quer? Papai vai te dar leitinho, Amélia. Papai te ama, você sabe disso..." "Acorda, menina! Vem aqui no quadro negro, vem soletrar "maluca". Isso aí, ma-lu-ca! E as crianças riam, e se refestelavam de prazer. "Amélia, o que deu em você? Não coma o giz, não! Tá maluca?"



Amélia  estava apenas nervosa. Quando a pessoa está nervosa, faz qualquer coisa. Quando não há saída, há sempre uma calçada, uma sarjeta. Uma pessoa crescida nem sempre cresceu por dentro. Nosso crescimento depende de outros. "Amélia, você quer leitinho do papai? Pra ficar grande e forte tem que mamar o leitinho do papai, Amélia! Sua mãe vai chegar e você não vai crescer, hein? Ai, Amélia , sua danada, cuidado com a boquinha, tem que esticar, tem que esticar, tem que esticar, isso....isso..... "Ai, Amélia, porque você é assim? Já é a quinta vez que te mandam para a diretoria falar comigo. Vou te recomendar à sua mãe um psicólogo para você. Suas notas são baixíssimas, seu rendimento social não existe! Amélia, você olha para mim, por favor? Estou mandando, menina! Sou a diretora desta joça e vou fazer de você uma pessoa custe o que custar, nem que tenha que chamar sua mãe aqui pela milésima vez!" Amélia olhava então para cima e pensava, e lembrava.... o buraco...o leite que fazia crescer... o papai...E rezava sem saber o que significava rezar. Tinha apenas sete anos de idade, mas rezava e pedia mamãe, mamãe....MAMÃE!

"Amélia." Dizia a mãe. "Que sujeira é essa na boca? Eu já te falei pra não tomar leite às escondidas! Leite é caro pra caralho, porra, que merda! Cadê seu pai, Amélia?" Amélia não sabia, mas sabia onde ele estivera quinze minutos antes. Papai, leitinho, papai, leitinho...como dizer? "Mamãe... o papai fez isso comi...." "Amélia!!! Puta que o pariu! Cala essa boca que te encho de porrada!" Amélia  calava, mas a porrada não, e depois ia pro 'buraco'.

Ninguém nunca conseguiu descobrir o que era o "buraco". Nem a instituição psiquiátrica, nem ninguém. Na verdade apenas uma pessoa sabia. "É, meu querido, eu já disse a você, se você for para a esquerda não vá. To te dizendo, é um conselho que te dou, companheiro. Porque a direita é má, é buraco, você sabe, eu já lhe contei, camarada, mas se você contar eu te quebro todo." Amélia levantava então da sua sarjeta na rua Raimundo Correia e andava a passos furiosos em direção ao café da esquina, em frente à banca de jornal, e gritava. "Eu sou o demônio! Eu sou o cabra-ruim! Vou fechar esse café! Vão todos para o buraco seus filhos de uma puta!" E continuava a gritar impropérios. O dono não ligava, pois sabia que as imprecações passavam de repente quando, sem mais nem menos, Amélia  se acalmava. "Vem cá Amélia, se acalme, sente-se aqui do meu lado. Eu prometo que não vou pela esquerda. Não vou cair no buraco que você caiu. Eu estou aqui e preciso de conselhos. Você é o demônio, não é? Então me dê um conselho, Amélia." Amélia , de novo se sentava no meio fio da sarjeta da rua e falava com o vento.

De noite Amélia juntava num canto seus pertences: uma caixa de papelão bem grande, e uns trapos de feltro e flanela velha que usava para se cobrir. Se enfiava dentro da caixa de papelão com tudo junto. Não gostava de baratas. "Amélia, tem barata no 'buraco'? "É bom que tenha, viu? Assim você aprende a não gaguejar besteiras sobre o seu pai. Tomara que uma te engasgue, sua idiota."

"Hoje vamos fazer uma experiência usando baratas em laboratório. Vamos testar a reação que ocorre quando o casco do inseto entra em contato direto com a substância alcoólica. Há uma desintegração líquida do..." Amélia chorava baixinho, olhava para baixo. Mas na verdade olhava cada vez mais para dentro. Era dentro de si que o mundo existia. Lá fora existia algo ruim, algo demoníaco, algo que não estava certo, não podia estar, Deus não deveria deixar estar assim, Deus não gostava dela. Por isso Amélia  se sentia o que sentiam dela. "Eu sou o DEMÔNIO!" "Vou fechar esse café!" " Seus filhos da puta!!!!

"Cadê seus pais, Amélia...? Perguntava o ser mascarado que a encontrava nas noites de quarta-feira, encostado sempre no poste perto do local onde ela armava sua caminha de rua. "Sai daqui, seu coisa-ruim! Meus pais morreram faz tempo! Eu tenho muitos anos, você nem imagina." Nem Amélia imaginava, mas já tinha sessenta anos. Quarenta e cinco de rua. "Amélia, o leitinho do "papi" tá acabando, sua mãe foi comprar fralda e está na rua (nunca mais voltou). Papai tá cansado, não tem mais tanto leitinho pra te alimentar. Amélia, você vai ter que se esforçar, Amélia. Amélia! Sua cachorra, vem aqui, sua puta, sua puta, sua PUTA CRIANÇA!!!!

"Amélia, quem te meteu nesta escola pública?" Você é tão feia que acho que vou te chamar pra sair, topa? "Amélia, isso aqui é um motel, querida. A gente vem aqui trepar. Você não vai dizer que depois de eu conseguir botar você, menor de idade, aqui, vai fazer cu doce né? Abre essa porra de perna. Vou te encher de leite, caralho!"

Saiu no rádio e não saiu na TV. O corte foi fundo, mas não matou. Amélia  foi jogada num buraco com grades, ficou uns seis meses lá sem julgamento, depois a jogaram fora. Já não falava coisa com coisa desde muito tempo. "Amélia, vamos desovar você aqui na Grota. A jaula ta cheia e não cabe mais ninguém. Tu ta mais arrombada que peneira velha. Vamos fazer um 'favor' pra você, Amélia. Tu é feia e desgrenhada para caralho, mas buraco é buraco. Tá olhando pra baixo porquê, é pra tomar no cu mais facinho é? Vem cá Josemir, vamos juntar essa aí e jogar no mato."

Amélia andou... andou...andou...e andou como pôde. Acabou chegando em copacabana. Primeiro dormiu na areia da praia, depois passou uns tempos na passagem que dá para o Bairro Peixoto até ser expulsa por uns pivetes que assaltavam, depois dormiu nuns bancos de praça, e um belo dia de sol, acabou adentrando pela Raimundo Correia, e ao passar por um prédio de grades negras viu sentado na sarjeta o seu futuro amigo conselheiro. "Amélia, ainda bem que você veio pela direita, esquerda não é legal." E assim conversaram e viram o tempo passar. E o tempo quando resolve passar passa mesmo. Sessenta anos! Sessenta anos de vida. "Vida coisa nenhuma! Seus filhos da puta! Eu tive mãe seus desgraçados! Eu sou o DEMÔNIO!!!!" E chutava as cadeiras do café e cuspia no chão sujo de copacabana.



Eu, sempre passava correndo, seguindo o meu caminho, e cada vez que eu passava por Amélia não sabia o quê era Amélia. Mas com pressa e sem saco, como ela nunca havia me pedido nem esmola, eu entrava no meu prédio e na minha vida de sempre. Mas os olhos de Amélia  eram vazios, outras vezes encolerados. Não há nada mais vazio e perturbador que a cólera alheia. A nossa a gente nunca sente...Mas a alheia é vazia. É um olho cheio de pupila, um olho quase de vidro, pronto para quebrar, um olho que implora explodir, pra que quem sabe, a alma não escape, não saia correndo e leve a loucura embora.

Amélia me olhava de uma forma esquisita, como que implorasse um contra-olhar, talvez de rendição ou de desafio. Mas eu passava ao largo. Sabia que era uma louca, e vestia o meu mais forte semblante, do tipo: "Nem chegue perto que to fervendo, sou pior que você, sai pra lá mulher". Tenho esse direito. Não quero amolação e não a conheçia. Porém me dava pena. Me dava um dó, e algumas vezes imaginei o que o meu anti-depressivo não faria por ela. Mas não faria nada....não para Amélia.

Eu sentia que ela ansiava por me chamar de demônio, ou por se proclamar demônio e me insultar até que seu 'amigo' mandasse parar. "Direita, Amélia , esquerda nunca. Olha o 'buraco'..."

Um dia olhei para aquela pessoa, dei meia volta, peguei um puff velho aqui de casa e levei para ela. Postei-me à sua frente, a olhei nos olhos endemoniados e disse: "É seu, toma". E deixei lá pra que ela dormisse melhor.

A vida de Amélia  tornou-se um inferno. Mendigos tentavam roubar-lhe o pufe. Pessoas olhavam e se admiravam. Até o porteiro tentou tirar o presente dela. "Amélia, dá a mãozinha, Amélia, papai vai te dar um brinquedo, você vai adorar..." "Amelinha, mamãe chegou e quer ter uma conversinha com você, senta aqui na almofada comigo, me explica porque na escola tão dizendo que você só olha pra baixo? Tá olhando pra cor da cadeira é, sua cachorra. Já pro 'buraco'!!!!!!!!" "Amélia, como se soletra 'pufe'? Não sabe? Vai levar uma coça da diretora, sua burra!" "AHAHAHAHAHAHAHAH!!!!! Amélia tem bunda grande, parece almofada! Amélia  tem bunda grande parece almofada!!!!" "Aí, companheiro, é só encostar ela naquele montinho fofo e mandar ver, depois a gente desova ela aí e foda-se essa feiosa."

Como a gente as vezes faz um mal sem saber, não é? Dia desses senti um cheiro de queimado. Bateu até bombeiro pra apagar o velho pufe solto em brasas na calçada. Era uma noite sem luar e Amélia havia-se ido. Como um demônio, nunca mais ninguém a viu.





sábado, 27 de agosto de 2011

A Chave do Entendimento

Minha vida é difícil sem ser. Quando penso que trilho um labirinto, na verdade vejo que eu mesmo sou o próprio labirinto. Algo... Algo que não sei definir trilha em mim. Existe algo em mim que busca algo que eu não sei o que é. Talvez essa coisa saiba onde quer chegar e não me avise. Talvez essa coisa me engane. Só sei que não a controlo, e que ela está fugindo. Corre desesperada batendo em paredes, chutando tetos, indo de encontro a saídas que levam mais pra dentro ainda do labirinto indefinido até por ela.


Dentro deste labirinto reside o meu coração. Que bem no meio deve sofrer com as pressões externas muito mais que qualquer outro órgão. O coração é às vezes uma donzela em perigo, ou um minotauro devorador. Este ser vermelho de vergonha, às vezes de raiva é sempre ousado. Insiste em bater apesar do tempo que bate contra. Com certeza é prisão, onde antigos amores e novos destinos se acomodam quase sem espaço para respirar. E haja remédio contra o colesterol pra que ele não entupa de resíduos plásticos, ainda por cima isto...

Talvez a tarefa do "algo" que perambula, às vezes corre, às vezes anda nebulosamente pelo labirinto que sou, seja atingir o coração. Só sei que às vezes esta coisa inumana senta am algum cantinho escuro e berra. Berra tão alto que não há voz capaz de reproduzir. Nem há ouvidos capazes de captar. Apenas os felinos, com seus olhos de luz, torcem os pescocinhos conspiradamente, e ouvem. Às vezes esse "ser" deita, olha para o teto falso deste labirinto que sou e chora. Chora baixinho porque sabe que nunca, nunca vai se livrar dele, e que quando atingir o coração será enviado de novo para qualquer lugar do meu corpo, e que dará voltas e voltas macias, porém dolorosas - a dorzinha da vida.

E isso vai durar como uma missão de reconhecimento dentro de um mar. Onde algo procura o Tesouro. Tesouro afundado numa cratera, escondido num cubículo de algum galeão espanhol, sob altíssima pressão, e que todos têm a certeza de que nunca será encontrado, ou melhor, talvez, desvendado, pois quem sabe se existe mesmo?

O monstro do Loch Ness reside em nós. O Pé-Grande habita em nós. O Bicho-Papão está preso em nosso labirinto e não consegue sair. E não há janela, não há portícula, não há buraquinho de esperança. O que nos move é o monstro que reside em nós. O que nos faz andar todo dia é algo que nos habita e que tenta escapar de algua forma impossível.

Quando este algo acredita na saída, aí existe esperança de se ir até a esquina comprar flores. Quando este "ser qualquer" sabe que seu destino é uma eterna prisão, não se vai nem até o interruptor de luz do quarto escuro em que se tenta acordar, e não se consegue.

E no fim, só a morte salva a vida. Vida que nos encurrala e nos transforma no labirinto que não queremos ser. Afinal, não estamos procurando nada. Há algo que procura dentro de nós. Como uma bactéria benéfica ou não, depende de vários fatores. E isso me entristece porque sinto que não tenho como ajudar, pois sou labirinto, mas não possuo a resolução de mim.

Talvez esta coisa seja Deus. Talvez Deus esteja preso dentro de nós, e não o contrário. Rezo pra que não. Pois tudo que sei é que nada entendo, nada vejo, apenas sinto pontadas na alma. Pontadas de alguém que tenta sair para me dizer a verdade. A verdade que nunca será revelada enquanto eu tiver cabeça.

E me sinto triste por tentar tanto atravessar labirintos de outras pessoas e não suceder. Me sinto triste pela confusão que não posso resolver, e que se volta cada vez mais contra mim. Me sinto triste por que sinto, também, eu ser "algo" buscando saída pelo labirinto de outrém. Visto que isto é impossível sem um consentimento real, e quem sabe a chave dourada do entendimento.

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Viadutos

Existe no Rio de Janeiro, mais precisamente no bairro da Barra da Tijuca um lugar chamado Praia dos Amores. Era uma praia. Que devia ser linda, pois pequena e quase na entrada do Canal de Marapendi, seus encontros de águas só podíam remeter mesmo aos amores e seus encontros. Um belo dia contruíram uma ponte, um viaduto enorme bem em cima dela e assim ela foi esquecida. Já não é mais uma praia.

O Rio Comprido era um bairro que descia como um vale vindo de Santa Teresa e que virava Tijuca. Parte nobre do Rio de Janeiro há pelo menos uns 200 anos, o seu Rio Comprido virou um viaduto construído na década de 70, e que infelizmente ainda fez o favor de desmoronar na cabeça das pessoas logo após a contrução. O Rio Comprido tornou-se então um viaduto.

O Museu, a orla do centro da cidade, seus quiosques aristocráticos de uma época de Império, são passagem incólume, porém ao mesmo tempo imperceptível ao sujeito ignorante, ao turista, e ao distraído. Suas margens devidamente aterradas deram lugar a um viaduto da Perimetral, que destruiu socialmente a região, em função de fazer o trafego fluir mais rápido na cidade. E não "existem" mais.

Quando morei nos EUA, morei na cidade dos Anjos, e tenho certeza que todos os "angeles" se perdem num tecido emaranhado de pontes e viadutos que levam a todos os lugares. Tudo que leva a todos os lugares na verdade leva a lugar nenhum. E percorrendo a cidade enorme, com um olhar prescrutador, pode-se perceber cantos de beleza natural encobertos por "freeways" e "higways" que balançam tanto quanto os terremotos diários da cidade.

Mas porque será que estou falando de pontes e viadutos? O que eu quero dizer é: voltando ao início, à Praia dos Amores, penso, quantos amores não foram encobertos por viadutos construídos pra que nós pudessemos de fato nos locomover, nos encontrar? E então penso que são tantos os viadutos desta vida que tenho a certeza de ser cada vez mais difícil alguém chegar a algum lugar. E que talvez se não houvessem contruído um minhocão em cima de um lugar tão perfeito como a Praia dos Amores, a vida seria mais ágil até. Pois, de que vale um viaduto que nos leva pra qualquer lugar quando existe uma Praia dos Amores pra te levar a lugar algum?

Eu que amei tanto em minha vida. Parece que a cada amor florecido construíram-se viadutos por cima, interrompendo assim a visão das minhas Praias, dos meus quiosques, dos meus museus de felicidade. E que exerceram a função de destruir os meus lugares de sonhos, apenas para que eu chegasse mais rápido a algum outro lugar que não existe dentro de mim.

Quantas mulheres praia-dos-amores vieram seguidas de viadutos que me roubaram a visão e adulteraram a natureza do que eram? Tanto que talvez nem fossem. O próprio facebook não é nada mais do que um viaduto, onde pessoas acreditam chegar mais rápido em lugares onde elas já estão há muito tempo. Há séculos. Bastava estender a esteira de palhinha da minha juventude por cima da areia, e esperar o encontro das águas.

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Ilhas e Trilhas

Imagine um baile
Um salão florido
A mesa repleta de frutas...
Quanto vale?

Imagine uma face
Extendida aos céus
Implorando sabe-se-lá-o-quê
Quanto vale?

Imagine um sono que arde
O amor crescendo a miúde
Tempo a tempo a chegar
Quanto vale?

Olha só, nesta tarde
Eu seguindo trilhas entremeadas!
Não havia visto ao longe
Um vale, um vale, um vale!


segunda-feira, 8 de agosto de 2011

A Crise Mundial

Bom, vou dar a minha opinião sobre a crise mundial e sobre o "declínio" da maior potência mundial, os EUA.

Tenho certeza  de que o que lemos nos jornais é repleto de baboseiras. Acho realmente que existe uma "força" X que engana quem lê. E acho que se 10 % dos economistas ou analistas conseguirem entender o problema da atual conjuntura mundial isso é muito. Ou seja: somos iludidos a acreditar em bobagens o tempo todo. Fala-se de muita coisa, porém acho que a explicação é bem simples.

Durante 500 anos o mundo inteiro foi colonizado por países mais fortes. Poucos países desenvolvidos que pilharam e extorquiram e dizimaram culturas e civilizações ao seu bel-prazer.

Nos últimos 100 anos, um país memorável, por ter sido colônia e ter se libertado de forma poderosa do jugo, enriqueceu graças às crises que afetaram mais a Europa do que o resto do mundo: as duas grandes guerras. Este país são os EUA. Que enriqueceu alimentando, dando suporte tecnológico, construíndo uma super indústria bélica lucrativa e principalmente dando refúgio aos milhares de sobreviventes e fugitivos das guerras. Especialmente judeus, altamente qualificados. Juntamente com Italianos, Irlandeses, etc. Ou seja: houve uma entrada de mão de obra cara e barata sem precedentes. Aqui no Brasil aconteceu a mesma coisa, porém menos. Deu-se início à guerra-fria, blá-blá-blá blá-blá-blá e blá-blá-blá....

Mas o grande acontecimento dos últimos 200, 100 anos foi o empobrecimento do "resto". A Europa, dona de uma cultura invejável e extremamente pragmática sempre se recuperou reatingindo seu grau de qualidade econômica. Os EUA enriqueceram de forma absurda movidos por uma locomotiva de pessoas cujo único interesse era crescer, prosperar dentro de um país livre, democrático, grande, rico em carga humana e recursos naturais. Um país que se desenvolveu e acabou desenvolvendo talvez mais do que devia, gerando uma nova geração riquíssima e portanto mimada.

Os EUA, hoje em dia, são um pais sucateado. Aquela locomotiva humana advinda da imigração refugiada da guerra, altamente capacitada e forte de braços, envelheceu e deu lugar a uma nova geração acostumada com a riqueza. O grande problema econômico americano é uma dívida de bilhões, que não se tem como pagar, e que foi protelada por anos e anos baseada na confiança de um estado forte, capaz e produtor. Só que este estado não é mais assim. O americano hoje (e já há muito tempo) consome três vezes mais do que pode pagar. Essa situação de super-bonança levou o americano a gastar e gastar e gastar não tendo que trabalhar o correspondente, ou seja, perdeu-se o lastro que é a relação enre trabalho e emprego. Há muito tempo o americano trabalha menos do que consome assumindo uma dívida enorme frente aos bancos mundiais.

Ao mesmo tempo a política deste país se polarizou em duas forças antagônicas porém muito parecidas. Dois partidos de direita, onde um se diz esquerda, mas não é tanto: Democratas e Republicanos. Os outros são pequenos demais e sem representação contundente. É claro que houve mudanças clareadoras nos EUA. Era um povo acostumado a lutar por seus direitos, e embora ainda seja, é bem menos. A locomotiva dividida entre inteligentes e fortes que ergueu a maior potência mundial do século XX esfriou, envelheceu e deu lugar a um povo indignado, porém acomodado em sua situação de suposta riqueza. E com uma raiva idiota do "inimigo" que vem de fora.

A Europa descente, ou seja, a democrática, ou que pelo menos se libertou a tempo de seus ditadores idiotas também cresceu, se unificou e se transformou num império. Mas cometeu erros nesta unificação. Uma unificação bonita, onde mercados menores ,como por exemplo o da Grécia, se uniram com grandes como França e Alemanha. Lindo, porém, inviável no momento em que um tem que pagar a conta da corrupção do outro. Governos sérios sustentando governos brincalhões pelo bem geral do Euro. Ao mesmo tempo a liberdade de fronteiras, tanto para europeus da comunidade, quanto para cidadãos de segunda classe das antigas colônias (todas praticamente européias) é geradora de conflitos de ordem social e econômica nunca dantes vistos.

A bolha que estourou em 2008 nada mais foi do que uma crise de liquidez, uma crise do crédito. Uma casa que valia 100 mil dólares não poderia ser vendida a 500 mil dólares . Bancos financiaram a orgia da gastação do crédito das super-economias. Para povos que podiam comprar sem oferecer garantias. Um belo dia alguém percebeu que a casa que valia 500 mil na verdade valia 100 mil. Obviamente esse efeito foi devastador nos países que se meteram na farra - os ricos. Países como o Brasil não deixaram de sofrer por serem mais sérios, mas sim por possuirem um histórico de inadinplência alta, de um povo miserável que, se comprava no cartão, possuía poucas chances de quitá-lo. Daí a precaução.

O Brasil é um país que engana o seu povo. Nossa inflação não é segurada com desenvolvimento e sim com o empobrecimento. Por exemplo: toda a vez que sobe a inflação o governo sobe os juros, empobrecendo o povo que deixa de gastar levando a inflação para baixo de novo. Mas a farra do último governo. A gastação do Lula, a quantidade de ministérios inventados apenas para enfiar funcionalismo público em troca de favores políticos, os gastos com um assistencialismo digno de país vermelho, a caritocracia, estão elevando a inflação. A solução do governo será a recessão, como sempre foi. O Brasil não é sério.

Mas o grande problema no mundo desenvolvido, o grande "insight", e razão deste texto é: os países desenvolvidos estão pagando o preço pela pobreza infligida ao resto do mundo por eles mesmos durante 300 anos. Especialmente os últimos 100.

Um país rico como os EUA não têm como pagar 50 dollares mensais para um trabalhador braçal. Pois os países empobrecidos têm. Um país rico como os EUA não têm como sustentar um povo que consome mais do que produz. Pois a China, empobrecida há 200 pela Inglaterra, hoje cresce a 9% ao ano graças a uma população pobre que trabalha por miséria. Enquanto um inglês não pode NUNCA trabalhar por uma miséria e viver em Londres, por exemplo.

Hoje americanos estão invadindo o México em busca de trabalho. É claro que não interessa ao México. Durante anos o México foi quintal pobre dos EUA, produzindo vestuário barato que ia ser vendido em NY pelo quíntuplo do preço, para americanos ricos que pagavam com cartão de crédito, ou seja, sem dinheiro. E mexicanos não podem entrar nos EUA.

Quando a bolha estourou, furou primeiro no mercado imobiliário americano. O que foi que o governo americano fez de primeira? Protegeu os bancos e instituições financeiras que faliriam por falta de dinheiro. Mas o governo americano errou. Existe um príncipio de um grande economista que diz: "Não existe almoço grátis." Esse é um princípio sábio, de vida, e não apenas econômico. Diz o óbvio: que a conta, é sempre paga por alguém. Se você janta com sua família num restaurante e não paga a conta fugindo pela janela do banheiro, o dono do restaurante é quem paga. E se ele não tem para pagar, o distribuidor de materia prima alimentícia no atacado é quem paga, e se este também decide não pagar, a dívida continua sendo repassada até que alguém pague. Ela não simplesmente se desintegra. Mas o Obama teve que fazer uma opção: ou ferrava o povo americano, ou ferrava as grandes instituições empregadoras do povo. Decidiu pelo mais fraco: o povo. Talvez acha-se que a crise passaria ao largo. Mas crise nunca passa ao largo. Obama apenas protelou o inevitável: o pagamento da dívida. Usando o dinheiro do governo aumentou a dívida americana, e o desemprego, pois o povo pagou a conta do Estado. Afinal, se baseado na tal lei econômica, nada pode ser salvo, pelo menos se algo deve ser ajudado esse algo deveria sempre ser o povo. Em 29 o governo americano, quebrado, foi contruir pontes, para que o povo pudesse trabalhar e gerar divisas ao final da contrução. Isso não foi feito agora.

Os EUA são um país divido entre dois partidos contrários à imigração. Que dificultam, hoje em dia, o que os tornou ricos no passado. Se os EUA liberassem a imigração de qualquer indivíduo, com potencial de trabalho, e pelo menos uma quantia de, digamos, 50 mil USD no bolso, e partisse para contruir pontes, de acordo com meus cálculos, pagava sua dívida para com o mundo. Mas não. Hoje em dia para se visitar a Dysneylandia já é difícil conseguir visto. Os EUA precisavam de um partido intermediário, que não tomasse chazinho como a Sarah Palin, nem que  tirasse onda de Revolucionário como o Obama.

O incrível, engraçado e tosco paradoxal neste momento mundial é que se todos os países desenvolvidos decidissem realmente investir pesado, não em suas próprias instituições falidas, mas nas dos países fodidos em desenvolvimento, isso geraria um impacto tão grande nessas sociedades miseráveis, que passando a possuir mais fartura não poderíam mais possuir uma população sub-assalariada. E só aí, então, o mundo "civilizado" teria uma chance de voltar a ser o dominante, líder de um mercado tecnológico que se esvai dentro da necessidade de produção de soja para alimentar chineses, trabalhadores braçais, de 17 horas por turno. Por incrível que possa parecer, a solução dos países de primeiro mundo é transformar o último mundo num ser igual.