quarta-feira, 13 de abril de 2022

Seja o que Deus quiser


 Entro no inferninho. Paro. Olho em volta muito bem. Cade eu? Não me vejo em lugar algum! Entrei neste bar para me encontrar, mas nada! Vou comprar uma cerveja. O bartender me olha como se eu fosse uma louraça - não sou. Pego minha cerveja e me dirijo à mesa. Um amigo meu reside nela. Dia e noite, não sai de lá! Sento em frente a ele, ofereço um gole e nada! Ele não me vê. É como se eu não existisse. Sinto isso pela primeira vez desde que entrei nesse inferninho frente à praia. Me levanto e vou até a pista de dança - nada! Ninguém interage comigo, todos me ignoram, não me enxergam, é como se eu fosse um fantasma. Fico maluco. Resolvo tirar a roupa, Fico todo nu. Ninguém me olha, ninguém se afeta, nada acontece.

Volto ao bar, o bartender é o único que me vê. Pergunto como!? Ele elogia meu corpo que não tem nada de mais. Mas não me responde. Eu insisto. Ele diz que não sabe de nada, abaixa a cabeça e volta ao seu trabalho e logo se afasta para atender uma cliente muito bonita que o espera do outro lado do balcão. 

Eu ando desesperado pelo lugar. Tento chamar a atenção do povo. O povo está bebado, fumado, entretido, louco e ninguém me nota. Eu, mesmo nu, sou um fantasma para todos. 

Tento concatenar o pensamento e descobrir a causa disso.....nada. Estou pirando. Não consigo enxergar mais ninguém também. Fico aterrorizado e ao mesmo tempo de saco cheio. Chego perto de um cara enorme, paro em sua frente, tiro seus óculos e enfio uma grande porrada no seu nariz de gorila. Nada! Ele fica estupefato sem saber da onde veio o murro, mas não me vê! O barman me olha! (como??)

Saio de lá completamente pelado. Vou para a praia e sou preso pela polícia por desacato a atentado ao pudor. 

Passo 40 anos na cadeia. Fico a maior parte do tempo numa solitária, sozinho, no escuro, sem me mexer direito.

Sou liberto aos 50. Volto ao bar que ainda existe. O barman ainda está lá e me dá OI. Acho que está tudo normal, afinal! Meu amigo ainda está na mesa bebendo o mesmo drink de antes. Corro pra falar com ele. Não me vê, não me nota... nada! Ninguém me vê! Nada mudou em 50 anos! Fico nu de novo, desejo ser preso e passar o resto na solitária, nu e sem ninguém me ver mesmo. Eu não existo. Só pra mim mesmo.


Saio do bar e seja o que Deus quiser.