Eleonora e Etevaldo eram ricos. Muito ricos. Gostavam de se divertir com isso. Passavam o tempo filosofando a existência e comendo tirinhas nos sushis da cidade. Entravam molambos, causavam impressão e tinham mania de provocar desconforto social como forma de se divertir e matar mais ainda o tempo que o dinheiro sempre tende a alongar.
Uma vez Etevaldo, num arroubo de saquê, insistiu que ia tirar a roupa toda dentro de um daqueles espaços reservados escondidos para os milionários que desejam discrição dentro de um shushi. Eleonora ria-se e engasgava-se com peças de salmão cru, e apostava mundos e fundos que Etevaldo nunca teria coragem de cometer tamanha loucura. Pois que o milionário tirou tudo. É claro que o maitre entrou, “reclamou” de forma constrangida, pois afinal, tratava-se de dois altos consumidores e o mundo é capitalista mesmo (nada contra). Daí em diante isso virou rotina na vida de Etevaldo e Eleonora.
A diversão dos dois se resumia em comer sushi e ficar pelado. Mas nada de sexo em público, nem entre paredes. Isso eles desprezavam. Consideravam coisa animalesca devida aos bichos, e que dentre os humanos apenas os “paraíbas” nordestinos a praticavam, aliados aos indianos e aos comunistas cabeludos. Até porque para os dois esta era a manifestação primária de um prazer visceral, digno das caravelas (não as de Port du Cal) que se esfregavam até que outra nascesse, e é claro que não é assim que acontece... Mas para Eleonora e Teobaldo que já tinham mais de 85 anos, comer sushi e mostrar as carnes flácidas era mais orgástico que sexo.
Pois é, eram dois velhinhos com carinhas boas e olhar arrogante, e que conseguiam conjugar felicidade e fim de vida, coisa que só é possível com uma conta polpuda no banco e alguns anti-depressivos, e sushi, é claro.
Pedro era um sujeito pobre. Não tinha nada, e nada o tinha. Trabalhava num prédio como ascensorista. Ganhava salário mínimo e seu único laser era namorar com Fátima, empregada doméstica do 501, pois o prédio era misto e conjugava prostíbulos, advogados, médicos e gente de bem também. Mas Pedro era extremamente puritano. Vinha de uma família pudica e tradicional de Minas que execrava (hipocritamente, pois faziam de montão) o sexo à toa. Fátima era safadinha, mas Pedro era até meio virgem, se é que isso pode existir. Pedro era na verdade um tímido do cacete, literalmente, e tinha até uns problemas de ereção aos quais atribuía a sua profissão de subir e descer tanto de elevador, que o deixava maluco. Dizia que isso devia deixar as veias confusas e o sangue ralo demais, além de dar dor de cabeça, e que de tanto apertar botão às vezes não conseguia apertar mais nada. Portanto este laser que Pedro tinha era um laser meia-bomba. Coisa de pobre mesmo, que transa vendo o flamengo na TV. Para finalizar o parágrafo, Pedro era incapaz de expor seu corpo, a não ser para Fátima, e mesmo assim com uma certa mineirice protocolar. Tímido até doer.
Num belo dia de sol, verão brabo do Rio de Janeiro, domingão de praia cheia, de ruas entupidas por turistas fugidios das crises mundo afora, e muita gente daqui mesmo, gente passeando, comendo, suando, fedendo, e se aglomerando pelas ruas de uma Copacabana que já foi Leblon, e que agora já é Centro, Pedro e Fátima vestidos, ele de roupa grossa de trabalho, e ela de roupinha delicada do Saara, almoçavam seu banquete mensal traçando um galeto, juntinhos numa padaria bem vagabunda, porém grande, e que fica na esquina da Santa Clara com a Av. Nossa Senhora de Copacabana.
Neste momento único nas vidas de todo o mundo começou a chover quíntaros, daqueles de causar tsunamis nas garagens dos subsolos dos prédios de classe média de Copacabana. E naquele mágico momento Eleonora e Etevaldo, saídos de um taxi, num bairro muito pouco freqüentado por eles (mas fazer o quê né? Acontece..) entraram correndo na fatídica padaria em busca de abrigo pois haviam esquecido os guarda-chuvas na cobertura de Etevaldo no Alto-Leblon.
Ao entrarem na padaria deram de cara com o casal, Pedro e Fátima, traçando o galeto como se fosse a maior e mais polpuda das iguarias de toda a gastronomia mundial. Etevaldo e Eleonora ao se entreolharem emergiram aquele sorrisinho de troça típico dos que não têm o que fazer com a vida já ganha, e no mesmo momento fizeram a Pedro uma oferta: que ele ficasse completamente nu em troca de um milhão de reais. Pedro no começo riu, duvidou, ficou até zangado achando que poderia ser alguma proposta indecente, sei lá... mas com tudo explicado e o cheque bem preenchido na mãozinha dele, olhou bem nos olhos de Eleonora e de Etevaldo e viu que ali havia a desvairada verdade dos que possuem alguma coisa e ficou completamente nu. E já sem roupa, num riso louco, seu pau, há tanto tempo meia bomba, subiu. E sob os olhares perplexos da multidão, e de sua namorada Fátima, saiu pela avenida em direção ao banco.
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