domingo, 19 de fevereiro de 2012

F......Ode ao Carnaval

Não vou escrever nada neste carnaval. Simplesmente porque as pessoas não estão nem aí para literatura durante esses dias felizes. Apenas me vem uma coisa no pensamento. Se o ser humano precisa de um dia para desabafar é porque algo não está bem, no geral. Afinal, todos sabem que a origem do carnaval se mistura com a evolução da Igreja Católica Apostólica Romana, que impôs ao mundo quase 2000 anos de privações. Nossas privações continuam?


Eu não fui a bloco algum. Mas houve época em que eu ia. Foi uma época em que eu me sentia sozinho demais. Não que eu ainda não me sinta às vezes. O fato é que hoje eu não estou sozinho como antes. Houve uma época em que eu não tinha nem pra quem dar "oi" direito. Aí eu ia para os blocos, quando chegava o carnaval, na esperança de que algo acontecesse, ou talvez conhecesse alguém interessante, ou me sentisse em contato com o calor humano, que me faltava socialmente.


Fato é, que quanto mais eu ia mais me sentia sozinho. Estamos todos sozinhos quando no meio da turba. A "massa" é inevitavelmente solitária. Por isso Budha sentou-se embaixo da árvore e respirou aliviado à sua solidão escolhida e aceita por ele mesmo. Estivesse ele no meio do sambódromo, ouvindo algum samba enredo idiota, estaria sozinho.

Como dizia Nelson Rodrigues: O óbvio é ululante, e a unanimidade é burra. Por isso, eu, no meio de um milhão de pessoas sambando sem nem saber o porquê. Ouvindo uma música que para todos não representaria nada mais do que o culto a uma alegria dormente, "lexotânica", "rivotrílica", frontalesca", só me sentiria mais só ainda.

Já dei minhas trepadas de carnaval. Já saí do bloco direto pro motel, sim senhor. Já fiz sexo vazio com alguma panaca que escolheu este dia pra liberar geral pro primeiro imbecil que aparecesse. Já beijei na boca, até em outros carnavais. Por exemplo: já beijei na boca uma menina que estava ao lado do seu namorado, que observou tudo sem fazer restrições. Isso aconteceu em New Orleans, onde o carnaval é o mesmo que o daqui , porém bem pior, pois nem música tem. E olhem que o beijo foi de língua, e muito bem dado por sinal.

E daí?  O que ganhei com isso? A realização de uma fantasia remotamente proibida, em tempos quase imemoriais sub-ensinados em escolas pudicas? Épocas de inquisição, onde portugueses saíam pelas ruas tacando substâncias tóxicas e mijo nas pessoas para se divertir? Para afrontarem a liberdade a qual lhes era impedida, proibida por papas já fantasiados de palhaços?

O que eu sei é que o espírito da alegria é lindo, e não faço aqui uma ode à tristeza, de forma alguma. Mas também não sinto prazer em seguir uma turba idiotizada, camuflada, que acha graça em mijar na rua e foder na esquina. Eu fodo quando quero e de preferência em algum lugar que não rescenda a cocô. Acho que o mundo de hoje deveria se sentir livre pra fazer o seu carnaval em qualquer época do ano. Não existe mais o sentido deste carnaval existir. Tanto é que, se pensar bem, ele nem existe. É uma mentira. É um clone dos carnavais passados. De épocas românticas, onde a hipocrisia segurava a decência das pessoas. Épocas muitas vezes narradas pelo meu pai, que viveu esse carnaval de arlequins e pastoras, de Amélias e donzelas virgens. Carnavais de confete e serpentina, onde cheirar lança-perfume era o máximo da contravenção normática aceita pela sociedade nesses dias.

Hoje cheira-se cocaína diariamente nos banheiros dos bares da cidade. Mija-se em público, onde bem se quiser, de dia, em bairros da zona sul, sem o menor pudor. Fode-se á luz do sol em praias cheias de turistas. Hoje estamos todos fantasiados em sites de internet. Trocamos nosso nomes, metemos máscaras no focinho pra encher o saco de pessoas, ou pra conseguir o pouco do afeto que ainda nos resta em sonhos de carnavais mentais, particulares, pertencentes a mente de cada um de nós.

Acho até bonitinho as pessoas se reunindo, se fantasiando, e até dispensando beijos e abraços furtivos de desconhecidos, em prol de circular pior aí em companhia de amigos também fantasiados de foliões. Falsos foliões esses são! Porque carnaval,. pelo que eu sei é putaria mesmo. Carnaval tem como símbolo inerente à sua festa beijar e foder no beco, com um desconhecido qualquer vestido de pirata. Era uma festa pagã, onde as pessoas se libertavam das prisões que as mantinham escondidas, e se rebelavam em liberdade autorizada por um curto espaço de tempo.

Mas hoje, ironicamente, o próprio carnaval se encontra fantasiado de palhaço, visto que tudo é permitido, tudo é possível. Portanto a festa da libertação acabou se transformando na festa da hipocrisia, onde as mulheres normalmente indecentes não beijam "porque só querem se fantasiar e se divertir com os amigos".

E dá vontade até de rir. Um povo que pára de trabalhar por uma semana, pra celebrar a alegria que possuem e não sabem que já lhes pertence. E eu aqui esperando um documento de trabalho que não sai porque a repartição pública tira férias todo ano. Como se fôssemos um país tão rico onde trabalhar pudesse ser facultativo.

Vão me achar um chato com esse texto. Mas é que eu to chato mesmo. Nesse carnaval me fantasiei de "incorreto". Vocês é que estão certos. Pisem bastante em mijo por mim, como se já não pisassem todo dia.
E sendo incorreto assim, quem na verdade está no clima do carnaval sou eu! (risos)

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