domingo, 27 de dezembro de 2015

Poeminha Sólido


Um cidadão pergunta para outro cidadão:
Qual o aumentativo de sólido?










segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

A Casa


Ó Deus, me perdoe, eu fui feliz
Mas perdi tudo, tudo, tudo,...
Não por ser ousado, mas aprendiz

Ó Deus, me perdoe, eu fui abençoado
E deixei passar a vida flores luxo
Não por ser atrevido, mas acomodado

Eu tive tudo e só achava nada
Agora acho nada dentro de tudo
E sinto saudades que me matam
Dia a dia eu morro da euforia
Que nas noites silenciosas
A lua me avisava e eu não via

Sinto a saudade da proteção de paredes minhas
Hoje sinto na carne o corte  da ironia

Que saudade, ó Deus, que saudade das janelas
Que pra mim eram simples, mas não! Eram belas...

Que saudade da escada que eu subia reclamando
Quanta injustiça minha, e ela me segurando...

A casa caiada de branco, o jardim onde fadas se escondiam
Eu podia tudo, qualquer desejo concedido me fariam...

Quanto vilipendiei, nem mesmo percebi o homem que eu era
Criança brincando como um tolo em anos de quimera

Ó, meu Deus, o quanto eu pequei...
Nos amores que lá deixei....

Ó, meu Deus, o quanto me maltratei
Sem perceber que era rei...

Ó, meu Deus, fui mau, fui mau, fui mau!
Quem mais me amou não teve amor igual...

Sinto saudades das esquinas mal traçadas e eu reclamava...
Sem perceber que era por ser um conto de fadas...

Sinto as dores da minha mangueira por mim plantada
Quando uma vez, por estranhos, despedaçada

Nós que tanto cuidamos dela...
Como pudemos entregá-la?

Sinto saudades da segurança da casa amada
Que me protegia e eu não a protegi de nada...

Hoje sei bem, sinto bem, o que só se sente na necessidade
Sei que o que perdi não foi matéria e sim felicidade

E sofro cada noite a ferida como sentinela
De esperar num sonho entrar de novo nela






sábado, 12 de dezembro de 2015

Ninguém se mexeu


Aconteceu num grande teatro de segunda nos fundos de um bairro que havia sido muito nobre mas que agora ninguém mais frequentava além de morar e viver. O teatro era luxuoso, e o luxo sempre sobrevive à poeira das cortinas e ao veludo enferrujado das cadeiras cor de sangue. Na plateia pessoas, na sua grande maioria pessoas velhas, com seus casacos de pele velhos e rotos, e seus bonés de outros tempos, e suas peles amarrotadas de estivadores de grandes embarcações. Não era um público pobre, pelo contrário, eram apenas "amarelados", com olhos lacrimosos e cheios de penumbra.

No palco empoeirado um quarteto interpretava o Quarteto em Lá Menor de Mahler. Você não conhece? Foda-se! Deveria. É de uma beleza sublime e confusa, melancólica como tudo o que estou relatando e que é a mais pura verdade, e que ocupava aquele teatro como os armários de madeira de lei muito escura e os balcões da cor de braços de violoncelos.

O quarteto chegava a um ponto da música, em que momentos dramáticos e outros rapacemente felizes comoviam os músicos além do normal. A música dentro daquele recinto velho e enegrecido pelos anos, como uma catedral abandonada e furtiva, era uma espiral onde almas iam sendo carregadas como que pelo redemoinho de Allen Poe, tornado sonoro causado apenas por três instrumentos doces e tristes - um violoncelo, uma viola, um violino e um piano de cauda longa que interpretavam com maestria a peça inacreditável, e os cabelos dos músicos voavam maravilhosos com o vento que não existia lá dentro, e era tudo tão lindo e tão precioso que o tempo podia parar.

Havia um ajudante de palco, algo assim, que virava as folhas do pianista no segundo exato. Houve um momento então em que ele deu um passo à frente afim de virar mais uma página da partitura e por uma razão desconhecida de qualquer um, por ventura, seu sapato bem polido pisou em algum pontículo lustroso daquele palco imundo mundano e maravilhoso, e enfim o homem escorregou para trás não conseguindo sequer tocar o caderno com as notas da música. Caiu para trás e sua cabeça bateu na cadeira de ferro fundido e madeira indiana rebuscada de capilares esculpidos à mão. O sangue derramou de sua cabeça e escorreu pelo piso corrido, e o homem morreu no ato.

Os músicos continuaram a tocar efusivamente como sempre. Ninguém na platéia se mexeu. E assim acaba este conto.





sábado, 5 de dezembro de 2015

Acordar


Já pensei em escrever um romance. Não acho que valeria à pena. Poucos leriam, ou quem sabe, ninguém. O mundo está cada vez mais aberto e fechado ao mesmo tempo. É como uma síndrome fantástica; uma revolta dos tempos; uma desandada na massa do bolo. Num mundo onde o acesso à informação cultural é total, mesmo assim tenho a certeza de que muitos não escrevem romances pelo simples presságio de que não serão lidos, perdidos na multidão. Mas alguns os escrevem, apesar disso. Eu não.

Nessas horas penso numa palavra: o vocábulo "acordar". Acorda-se todos os dias até o último suspiro. E esse é o fato mais importante da vida, para os que creem nesta aqui e agora e pronto, acaba-se. Não sei se é meu caso, mas isso não importa agora.

Posso estar errado, mas a palavra acordar tem uma etimologia interessante. Existe uma história por trás de qualquer palavra - nada é em vão (olha aí outra!) Nossa linguagem é toda metafórica. O uso das palavras é belo no seu sentido escondido, poético. Perdido no tempo andamos sem pensar que as palavras também se perderam nesse mesmo tempo. Acordar me remete a uma preposição (a, para, etc.) e um substantivo (corda). Os dois transformados num verbo profundamente poético. (Aliás, acabar, escrita no parágrafo acima significa levar a cabo - que tem a ver com corda também, viu? )

Acordar é o que fazemos todos os dias. E todos os dias para acordarmos é preciso agarrar numa corda imaginária e levantar. Para a corda - acordar! Essa corda imaginária de todos os dias vale para todos os momentos, mesmo àqueles em que não estamos dormindo, assim a acepção do vocábulo levado à um nível poético mais avançado, e portanto mais  poético ainda. É a própria linguagem criando braços, se tornando humana, tentando escapulir da gente e se agarrar em sua própria corda num fenômeno linguístico lisérgico. A toda hora nos deparamos com vocábulos da mesma natureza. A palavra "agarrar" é a mesma coisa. Usamos nossas garras de milhões de anos de evolução para agarrar nossa corda diária.

É claro que nem todas são assim, embora eu acredite que são. Em algum túnel do tempo, fechadas nas raízes do passado extremo - aqueles que escondem catedrais metros e metros abaixo da Terra e que só alienígenas hão de escavar um dia na tentativa de nos acordar.

Eu poderia escrever uma tese sobre isso. Ou mesmo um romance preambulado desta forma, mas não. A mim só resta abrigar o que há em mim. Como quem briga e está "a brigar" por alguma coisa que só eu sei, só eu entendo, e que se chama Arte. Como o oxigênio a te inundar de vida: Ar-te.





-sexo- 



terça-feira, 1 de dezembro de 2015

Pedra


Existe em diversos lugares do mundo pessoas que moram em grutas no meio do mato. Sim, é verdade que dormem em cavernas, sentam-se em cadeiras de pedra, aconchegam-se em leitos de folhas secas, e respiram umidade e têm morcegos como companheiros. ..............   E são felizes.

Onde estamos? Onde está o Homem? Sempre em cavernas, mentais ou florestais. Diferente apenas pela matéria que pode tocar. Porque até a matéria luz do que ele significa deve ser a mesma, pois habitamos o mesmo desconhecido, sempre.

Algumas cavernas luxuosas, outras menos, outras apenas cavernas. A mente em si é construída pelos mesmos azulejos,pelo mesmo cimento - o glúten da pedra! Estica-se a pedra conforme se pode. Reveste-se a pedra para que não pareça pedra; ou expõe-se a mesma para que pareça pedra bonita, pedra de lei, cara rica e rara, Carrara.    .................  E são felizes.

Mas o que há? Tudo é pedra e buraco nela. Vive-se em pedras como pensa-se em pedras. Nosso cérebro nada mais é que um paralelepípedo que pensa pensar. Pensamos ou simplesmente nos entupimos de massa branca? Moldamos nossas esculturas de acordo com o que acreditamos, e o que acreditamos é o que nos fizeram acreditar - aqueles seres de pedra.

Não é à toa que somos, cada um, cientificamente comprovados poeira de estrelas.

Pedra.