A vida carrega mais sal do que terra. Terra é fácil de encontrar. Já o sal valeu muito dinheiro no passado. E por incrível que pareça já virou cliché o "sal da terra". O que será que faz duas coisas se completarem?
Eu não amo. Não tenho mais amor no coração. Faz tempo que só amo o uísque que tomo. Bom.... o rum, porque uísque anda meio caro pra mim. Então tomo rum sempre do mais vagabundo, admirando sua cor transparente, inexistente. Rum é terra, sal é uísque.
- Porra! Mas uísque tem cor de terra, e rum de sal, acho que você está confundindo as bolas.
- Bolas não. Você sabia que a maioria das expressões linguísticas brasileiras são perversas? Por exemplo: "fazer nas coxas". Já ouviu coisa mais feia que isso? Significa gozar nas coxas da mulher vírgem como forma de desabafar a necessidade sexual antes de um suposto casamento. Gíria antiga que nossos pais adotaram sem nem pensar no desequilíbrio psicológico que nos causaria (e causou) em nossas vidas. Outra: "levar a vida na flauta!".
- Não! Essa não tem nada a ver com piroca. Você tem uma mente doente!
É claro que tinha uma mente doente: passou a vida sendo chamado de ***** no colégio, no trabalho, no futebol, na rua. Fez uma aula de jiu-jitsu pra ver se dava porrada em algum deles, mas sofreu bulling do professor, pode? Fez kung fu, mas a academia era uma espécie de gang, onde o professor oferecia serviços de "ajuda", caso algum aluno possuísse rivalidades na escola.
- Pô, mas isso até que era legal! Pena que com os novos tempos, e a consciência orgânica de tomates isso foi por terra abaixo. Acho que um professor de kung fu justiceiro faz falta neste mundo de merda!
De novo a palavra "terra". O que realmente significa "terra"? Estrume? Cama de flores? Vida? Merda? Tudo isso? Terra é o paradoxo do sal. E mesmo assim ambas andas juntas num "song" dos Rolling Stones. Porém terra é totalmente diferente de sal. Terra enobrece, alimenta; o sal mata, assepcia, limpa.
- Cara, eu surfo há anos e sei que a fauna marítima, especialmente os corais onde me arrebento não sobrevivem sem o sal. Até se cozinha com sal marinho, água marinha na moqueca é o bicho!
- Pe-la-mor-de-De-us! Moqueca cozida com xixi de caranguejo é o fim! Eu não faço, não adianta.
Houve uma época em que as pessoas achavam que seus leitos de morte eram o mar. E por isso, no momento derradeiro, alguns malucos pisavam as areias de copacabana em direção às ondas que os levariam ao Valhalla carioca.
- Cara, eu lembro do terror que eu sofria quando minha mãe me segurava no colo, ainda bem menino, e adentrava as areias de copacabana me levando à força. Meu medo sumiu. Hoje em meus sonhos surfo Waimea. Mas o engraçado é que outros medos ficaram, e nada tem de salgados, são muito mais ligados à terra que outra coisa.
- Um minuto, vou pegar um rum...
Fazia coquetel de rum com rivotril. Sabe o que sentia?: nada! Pode isso? Morava numa cidadezinha de Ohio, e enquanto bebia admirava a chuva que caía quase o ano inteiro.
- Cara, sabe o que eu gosto de fazer aqui? Sair neste frio de quase inverno apenas vestindo uma calça de veludo e mais nada. Gosto do choque térmico. Esse choque térmico me lembra das aventuras que quero viver.
- Fodam-se as suas aventuras! Eu quero apenas ter um jabuti, no Hawaii eles sobrevivem, se bobear levo pra surfar.
O Frio é salgado; o calor é feito de terra, de lama. A chuva que cai na pele, não importa, sempre nos enternece, ou nos mata. O rum um dia será uísque, e no fundo será a mesma coisa que uma prostituta encostada num bar de Las Vegas, ou do Meridian de Copacabana.
- Sabe que de longe Meridian sempre me pareceu Merdian?
Que merda!