sábado, 20 de abril de 2013

Texto Folk

Minha vida é um ciclone afastando ilhas orientais. Minha vida já foi um furacão devorado por outros maiores. Fui saindo de fininho das tormentas em que ainda me encontro. Parece que nada tem jeito enquanto se caminha. Vamos sempre ao encontro do próximo paralelepípedo que vai nos ensinar a cair direito. Quando eu era pequeno em minhas aulas de Kung Fu o professor nos fazia pular por sobre uma cadeira e cair rolando pelo chão, sem tatâme ou qualquer maciez. Me machuquei várias vezes e continuo. Mas ela vem, coberta de algodão doce, com cabelos de trigo, e quem sabe olhos que me ajudam a olhar, com óculos coloridos e a sabedoria de um George Harrison feminino, cheia de meditação nas pontas dos dedos, e ouvidos que entendem o mar.

Ela me pede para contar minha vida em palavras. Não saberia. A vida nunca cabe num texto, ainda mais no meu. Digo apenas que fui salvo por momentos. Já enganei pivetes em Ipanema, e já fui enganado por ladrões de necessidades mundo afora. Já levei estabacos pelas areias de Copacabana, e já tive muito medo. Aliás, nasci com o medo incutido em meus olhos que viam a praia como um horizonte sem fim. Tudo que eu olhava parecia contrário a mim. E a normalidade para mim era algo que ainda não existe. Aprendi a segurar no laço e a saltar do abismo da minha cadeira. Falo assim, porque minha vida é algo figurado. Não tem explicação. Talvez a droga que nunca tomei explicasse, entretanto houve o momento sublime em que o álcool me transformou em Buda. Mas ela vem devagarinho, sempre em sentido contrário ao tráfego, contra os carros que acreditam escapar de alguma fúria inicial. E ela me veio em sonho uma vez quando pequeno, e nunca mais a esqueci, e ainda acho que é a mulher da minha vida, embora fosse sonho, ou não é.

Sou muito vago, ela diz. O vento também é. Minha vida é apenas uma vida. Como a de qualquer um, sempre foi diferente das vidas dos outros. Paradoxo de sangue nas veias. Às vezes quero mijar e não consigo, às vezes quero sonhar com alguém e não consigo, às vezes queria que minha avó me perdoasse, mas nada acontece. Porém tudo acontece, e de longe as coisas são longínquas pois que parecem remotas mesmo assim. Quando penso que sou um pedaço de papel em branco, basta olhar para um segundo atrás e ver que sou mais dinâmico e explosivo que a bomba atômica. Minha vida passa como uma velha estrada empoeirada onde nada passa, mas onde o vento sopra forte e tornados muitas vezes arrancam suas manchas brancas, e há serpentes nas encostas e pitangueiras emergentes que alimentam beija-flores que se confundem. Mas ela vem. E vai surgir por entre cáctus verdes e pontudos, num far-west tropical. Ela talvez venha do norte, ou do sul, quem sabe? As direções só existem porque existe algum lugar em que estamos. Será sempre do norte, então pronto! Ela vem com seus cabelos remodelando o vento, vem em passos calmos e cadenciados. Toca violão ou não. Canta algo que me atinge do lado, ou não. Como uma interpretação de um jazz, me acha bobo e transverso. Sou apenas verso. Ao fundo desse mundo inverso tocará uma música de Django Reinhardt, e ela - deserto - virá procurar minhas mãos que hão de irrigá-la para algum lugar que não sei bem onde fica.



4 comentários:

  1. Gosto muito do seu texto: tava esperando por algo mais longo e denso. Lindo esse!

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  2. Valeu Isabela. Me perdoe... mas nem sempre sou denso, às vezes sou farinha de trigo. Volte sempre.

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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