quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Brasileiros

O que estou fazendo fechado aqui dentro, meu Deus? Parece horas... devem ser horas! Minha cabeça dói, dormi tanto, e tava tão escuro, e agora essa escuridão... é como não abrir os olhos. Não consigo me mexer muito bem. Mas que lugar apertado! Não dá pra me virar de lado muito bem; meu ombro fica preso... Deve ser uma espécie de caixão, só pode ser: morri e acordei! Puta que pariu, será que ninguém percebeu que eu estava vivo? Mas que gente burra, caralho! Eu sempre achei mesmo as pessoas burras: tava certo! Burras pa-ra ca-ra-lhooooo! Caralho!!! ME TIREM DAQUI!!!!!!

Ih.... pera ae! Isso aqui não é caixão. Tá com um cheiro de graxa do cacete. E gasolina também! Acho que se eu tivesse a sete palmos não ia ter cheiro de nada. Não - ia ter cheiro de merda, estrume, roça, sei lá... Isso aqui com certeza não é caixão de morto. Caixão é mais confortável, né? Minhas costas tão doendo, tô de mal-jeito - ninguém bota defunto de mal-jeito, porra! Acho isso uma puta de uma falta de respeito: botar defunto de mal-jeito! É foda!!! Quem tá vivo tá no bem-bom, pimenta no cu dos outros dói, né? bando de viados! Mas esse treco não parece ser caixa não. Não tem nem almofada, nem aqueles bordados de cetim, aqueles panos macios que eu vi num filme... Será que me botaram como indigente??? PUTA QUE -PA-RI-ÚÚÚ -CA-RAAA-LHO BO-CE-TA!

Não... calma Zé... relaxa... respiração! respiração! Lembra o que aprendeu no retiro de yoga e meditação... MEDITAÇÃO É o CARALHO ZÉ!!!! Cê tá preso, QUE TREM RUIM!!!!! Ai.... (silêncio)... '......'.......'.......'..........'........' - acho que isso aqui é um porta-malas. É issso! Tá fedendo a macaco! Cheiro de graxa do cacete! Me enfiaram num chevete, porra...

Quer saber? Por que é que eu fui vir para os Estados Unidos!!!? Eu já tava afundado na lama lá no Brasil. Naquela porra de bosta de Uberaba! Agora, tô preso num chevete na Flórida! Ô ironia......! Pra ficar preso assim eu devia ter ficado em casa. Que saudade da minha mãe... Que saudade da puta da minha ex.... Que saudade da minha corneta de tomar banho, cacete, que saudade...... (choro)....'.....'......'.......'..........'..........'.

Calma. Calma, Zé! A polícia aqui é boa. Vão me descobrir. Não é que nem aquela merda de Brasil. Ainda mais em Minas - polícia mineira.! Lá eles não trancam só num chevete não! Lá é terra de macho! Lá eles botam num fusca e ainda jogam no rio, tá pensando o que, sô?!!

Ih, caralho, que porra é essa?! Parece que tá entrando um líquido aqui pela porta do bagulho! Putz...será que tô em Minas??? Mas voltei como? Será que já me deportaram dentro de um fusca? Não... não tem como eu entrar num fusca com essa minha barriga, brou... Num fusca num cabe nem meu pau. Porra, Zé, tá na maior merda e ainda consegue rir? Brasileiro é foda!

Caralho, esse líquido é esquisito! Tá com cheiro de cachaça! Ih, aí.... é vodca, Zé! Fala sério! Rapá - tenho que dar um jeito de sair daqui, que tá surreal. Acho que se eu me virar um pouquinho de repente acho uma chave de fenda, ou o próprio macaco, sei lá.... To ficando sem ar!!! Aí, é pânico, é PÂNICO! SOCORRO! HELPI, HELPI!!!!

.......................................................

Ai, minha cabeça.... acho que desmaiei... deve ter sido o cheiro da vodca, o álcool, né? Aí, uma frestinha de luz.!!! Chutei!!!!!!!!! PORRA!!!!! Tô livre! Essa porta abriu! CA_RA_LHOOOO!!!! Olha só! Não era chevete, é um carrinho até legal, mas o que que eu fui fazer dentro dele? Quem me botou aqui? Aliás....quem abriu o capô????

Minha perna tá doendo pacas! Deixa eu dar a volta aqui no carro...Caralho, to no meio do deserto, bicho! Pra quem tava na Flórida andaram longe comigo. Devo ter feito algo sério! Só não me lembro o que foi, mesmo....

Deixa eu abrir a porta aqui do lado do carro. Ih! Caralho! Mãe de Deus! Puta que pariu! Um montão de dinheiro dando sopa!!! Porra, vou pegar pra mim e me mandar....



quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Alegria, Alegria!

Falar sem dizer
Dizer sem sentir
Sentir sem conceber
Conceber sem entregar
Entregar sem enxergar
Enxergar sem atingir
Atingir sem viver


Viver sem viver
Sofrer sem sofrer
Amar sem amar



terça-feira, 21 de agosto de 2012

Mal sabe ela.

"There was a time when I was so broken hearted...."
(Aerosmith)

Eu só gosto de andar nas ruas à noite. Muita gente me acha esquisito. Muita gente ri da minha pele  transparente. Muita gente me acha estranho. Muita gente me acha isolado. Muita gente não acredita que eu não vou à praia. Muita gente me critica por não gostar do Rio de Janeiro do jeito que é. Muita gente não vê em mim as luzes que iluminam as calçadas por onde ando. Gente estranha essa.

Eu também ando de dia. meu signo de agosto é o próprio Sol, e eu sinto fogo em meus pés. Porém não gosto de andar de dia. Muita gente critica minha revolta. Muita gente acha que eu deveria ter paciência com os velhinhos que emperram o fluxo das calçadas. Muita gente acha que eu deveria comprar um cachorro pra fazer xixi e eu catar cocô. Muita gente acha que eu deveria andar sem ouvir meu Ipod que nem um louco cruzando tráfegos de ônibus que tentam me assassinar. Muita gente acha que eu deveria sorrir sem motivo.

A verdade é que o Sol é meu amigo, mas a Lua é minha namorada. E meus pés carregam dentro deles a energia estática dos velhos Mustangs do deserto, e acho mesmo é que os velhos é que não têm paciência comigo. Sou uma flor estática. Sou uma concha do meio fio. Muitas vezes, colado em pixe, tive que mascar chiclete e fingir que o tempo não existia em minha boca. 

Portanto, não há nada como uma noite vazia. Um caminho sob o luar, mesmo que seja pela Nossa Senhora de Copacabana, por entre os mendigos e bêbedos que tanto conheço bem. Sou daqui. Um dia já catei tatuí na praia, no outro catei moeda no chão. Se passei uma imagem de paupérrimo revoltado, você errou, amigo. Se a Marisa pode ter o seu Universo Particular porque eu não posso ter o meu Lixo Próprio? 

E esse lixo é como uma daquelas caixinhas de marionetes da época de Versalhes. Feita para crianças fantasiarem o futuro. Assim eu fantasio meus sonhos colhendo imagens pela noite vazia e perigosa. Sou protegido, nada me atinge. Se um ladrão se aproxima, eu o saúdo; se um pedinte me aborda, eu agradeço. Não há nada que me atinja mais do que as pedras do calçamento, e me dão paz. 

Já estive em muitos lugares. Já percorri o mundo, e já fui enganado pelas meretrizes, e abraçado por traficantes que me tomavam por cliente. Otários. Eu não compro nada que não me faça a cabeça. Da noite, eu já a percorri de cabo a rabo em todos os continentes. Já estendi meu lençol de pano de bruma em todas as ruas. Quando em Londres, eu desviava o "fog". Quando em Israel eu desviava as pessoas, quando em New Orleans eu desviava os ratos, e quando no Rio eu desvio o lixo acumulado nas calçadas.

E sabe o porquê? Porque passei a vida a procura de amigos. Mais que amigos! Passei a vida à procura de alguém que fosse pra mim. Alguém que raciocinasse. Alguém que me olhasse nos olhos e dissesse: compreendo! Se achei? Não. Só digo que continuo procurando minha utopia marginal, por entre frestas e buracos dos labirintos da cidade, que são compatíveis com os da minha alma. Pois o que é a cidade além da nossa carne em putrefação? 

Adoro vagar à noite. É quando consigo pensar. Adoro o "me sentir sozinho". Aprendi a tirar proveito da saudade. Aprendi a ser um leão solitário. Gosto das buzinas esporádicas. Dos estabelecimentos bem fechados. Admiro o caos neurótico em energia potencial, esperando explodir de manhã. Sinto o frio nos ossos e isso me queima mais que o Sol. Gosto dos seres da noite. Estudo os micróbios sociais como se eu fosse um deles. Mas não sou nada disso.

Hoje, depois de tocar uma música, uma menina me disse que na verdade eu sou um romântico. Mal sabe ela....



sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Estátua de Sal

Sabe aquelas noites longas de trabalho, onde no fim de todo o esforço,  todo o ferro fundido na tentativa de  fazer cobre, você sai com uma amálgama errada? Quando é preciso abrir o ralo e descarregar por ele todo o seu suor que parece merda? Sim... as noites em que seu esforço valeu de nada, deu errado: fim.

Eu, sentado na mesinha da cozinha, observo humildemente umas formiguinhas, que nunca erram, rodeando felizes e loucas um resto de doce escorrido pela mesa. Penso em passar um pano e limpar, liquidar com tudo.

Bato com a ponta dos dedos na mesa tentando assustá-las. É o meu aviso. Saiam logo, fujam! Preciso limpar a droga da minha mesinha de cozinha, depois vou dormir. Saiam! E elas começam a fugir. Sem nada entender, elas começam uma dança catatônica, caótica, de salve-se quem puder. Mas nem todas parecem querer largar seu quinhão de doce. Outras pensam em correr, mas não conseguem vencer o desejo do mel. Algumas poucas realmente fogem. Eu então me canso, e passo o pano molhado por toda a mesa, limpando o doce junto com as formigas que resistiram, que ficaram matando seu desejo de sejá-lá-o-quê.

Diz a Bíblia Sagrada, Velho Testamento, na minha escrita precária e incerta: E Deus decidiu destruir as cidades de Sodoma e Gomorra, devastando-as com uma bola de fogo vinda dos Céus. Porém, tendo Ele percebido um indivíduo justo, mandou anjos para avisá-lo da grande catástrofe. Avisou, então,  Lot que de forma alguma, durante sua fuga, olhasse para trás! De outra forma se transformaria em estátua de sal. E assim fez Deus; e assim fugiu Lot com suas duas filhas, e sua mulher, que olhou para trás e virou um pilar de sal.





sábado, 11 de agosto de 2012

Risos

Ninguém pode com as mulheres de hoje em dia. 

K. foi numa festa, convidado por um amigo de uma banda de rock. A festa estava meio vazia, poucos homens, poucas mulheres. B. se recostou no balcão do bar com cara de quem não sabe se vai embora, ou se enche a cara. Naquele momento notou a presença de quatro mulheres que conversavam juntas. Estavam ligeiramente perto dele, especialmente uma delas, a mais bonita. Esta havia se movido e, embora de costas, se encontrava a cerca de um metro dele. Foi então que B., num impulso, perguntou  se poderia oferecer-lhe uma frase, escrita só a para ela, descrevendo sua beleza. A menina respondeu que sim, "claro!", e sorriu para ele com atenção. K. pensou: "essa vai ser moleza, tenho aqui na minha cabeça algo legal pra ela, escrevo bem, ta tudo certo." Não tinha caneta. Pediu à menina que estava ao lado dela, e que parecia mesmo ser sua irmã, e que prontamente atendeu. K. então se debruçou sobre o balcão e escreveu a primeira coisa que lhe surgiu na cabeça, deixando de lado completamente a frase que antes pensara. " O Sol só se põe quando seus olhos fecham, e a Lua só aparece para iluminar seus olhos fechados -  tanta é a sua beleza, o universo gira assim." 

Feliz da vida, achando ter escrito uma obra de arte, K. se voltou à menina, e ofereceu a ela a linda frase escrita num guardanapo qualquer. Ela leu, sorriu, sorriu mais, olhou para ele com olhos doces e proferiu: "Assina pra mim?".

K. feliz da vida, se sentindo um escritor, um artista, um galanteador de primeiríssima, digamos até... um CASANOVA!, voltou ao balcão e assinou com cuidado a estupenda frase que com certeza conquistara os doces olhos da linda menina . Depois de devidamente subscrito o texto, K. entregou à menina, e pediu a ela um telefone de contato. 

Ela fez um movimento  negativo com a cabeça, e em um segundo seus olhos doces se transformaram em olhos maternais, olhos de uma adulta perante um menino de quatro anos de idade. Surpreso, K. perguntou o porquê, alegando que havia feito algo bonito só para ela, e que merecia um contato qualquer, telefone e-mail, facebook, qualquer coisa! A menina, como resposta, mandou um "não" tão ilógico, que esbofeteou a bochecha de K. como uma bomba aviltante. 

Então, como se nada houvesse acontecido, as duas meninas, que pareciam irmãs, deram as mãos, e junto com elas, um beijo de língua, desses maravilhosos, coisa de cinema...

Fim do "contículo".

Moral da história: hahahahahahah!



quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Bailarina

Vi você surgir na noite branca
As mechas de seda, o corpo de louça
A luz das pupilas, as mãos vadias
Serpenteando fugidias pelas vistas.

Vi você surgir na noite louca
Alva bailarina do corpo de loura
Enquanto, sentadas em sedas atentas
Vistas serpenteavam fixas e tensas.

Viram-se de repente nuas
E foi quando eu a vi rodopiar
Do abismo do palco saltar

Abrindo seus braços como num aceno
E solta, tão solta, de repente arriscar
Um salto para dentro do mar.



quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Vou te contar...

O adolescente é um sujeito confuso, até porque ainda não é um sujeito formado. Mas é um ser-humano. Hoje passou em minha memória um halo de nuvens, que me embriagaram a alma, e trouxeram da lama recordações de situações percebidas nos meus tempos. E é justo perceber que lama não é um anagrama de alma à toa.

Lembro de um menino que um dia, pegando um ônibus circular, indo para sua escola no bairro de botafogo, encontrou no meio daquela multidão assardinhada do ônibus, maioria composta de moleques travessos e barulhentos, o grande amor de sua vida. Estava ele a apenas uns dois metros da  menina mais linda que havia visto em sua vida em recém desenvolvimento. Trocaram olhares, e no final um sorriso de pena, pois não saiu de seu coração a coragem necessária para vencer sua timidez e mostrar ao mundo, de um ônibus, que amava aquela menina, com toda a força de que possuía - sua alma ainda virgem . E sendo assim, teve que vê-la saltar do ônibus decepcionada. Uns dois meses se passaram e, na mesma linha, a encontrou. Teve coragem, desta vez, saltou do ônibus num ato digno de um Perseu, mas ela já não se lembrava dele. 

Como é injusta a memória das crianças. Como é fútil e rápida a psiqué de quem ainda se encontra em ignorância vital. Ao contrário, como envelhecemos e nossas lembranças são capazes de puxar remanescências tão longínquas como a deste menino. 

De que vale a melhor fase da vida, se o menino não soube aproveitá-la. Por isso mesmo, eu digo que um dia terei noventa anos e me divertirei distribuindo gestos obscenos às garotinhas de 15 anos do metrô. Hoje nós somos este menino.

A alma continua seus devaneios, e as nuvens que me surgem , parece, surgem de Plutão, de Vênus, de "fogs" ingleses, onde continuo vendo esse pobre menino a vagar por praças empoeiradas de véu frio e quimérico. Vejo então esse menino vagar a cidade toda, sem o medo natural dos velhos e precavidos, por uma Londres escura e medievalesca,  a procurar aquilo que não se deve procurar, apenas nos livros e poesias.

E vejo esse menino ser ludibriado por taxista inglês, e cair de bobeira numa boate, entrar na boate, e no meio de imensidão das diversas nacionalidades estudantis, se deparar com outra menina mais linda que a primeira. Cabelos negros, olhos da cor da purpurina mais azul e brilhante, vir em sua direção, quase encostar a boca em sua boca, esticar um braço, uma mão em sua direção, e em questão  de segundos, sumir quase como um sonho, ou seja: foi um sonho.



E ainda vejo esse menino vagar pela garoa da cidade mágica, entrar numa casa de shows eróticos e dar de cara com uma prostituta adornada por um colar de sua religião, que revelaria apenas através de formas e brilho, toda a sua história de vida, jogar o cordão para trás do lindo pescoço, e simplesmente enrubescer ante uma pergunta adolescentemente mal feita.

O adolescente cresce e tudo o que ele vê são dívidas e sonhos despedaçados. Na estrada da vida, nossa alma ao mesmo tempo que vai crescendo, vai desintegrando pela estrada, pedaços importantes de nossa história que não importam tanto mais. E ela vai diminuindo ao mesmo tempo que cresce. E vai assentando, seja com remédios, ou com filosofia. Mas aprendemos muito mais a ser macacos do que homens. Mais simples. Mais árvores, mais "zen". É importante que as coisas cheguem à gente, e que nosso poder uma vez limitado pela timidez, parte a ser limitado pela experiência adquirida de esperar o momento certo. 

Nada funciona no momento errado. E existe ciência em Las Vegas, quando você joga um par de dados e ganha - pode ter certeza. O destino é apenas o nada conspirando pelo tudo. E quanto antes aquele menino aprender que a oportunidade está no calor de suas mãos, ou invés da purpurina da menina, mais ele será sábio e controlador de seus atos. E que vamos findar, mas a linha 511, que vai para a Urca, vai continuar passando, e passando e passando, inexoravelmente até o fim dos dias...

E que esse menino um dia sonhou um sonho inesquecível. E que dentro deste sonho havia a mulher de sua vida. Com toda sua descrição física, psicológica.. E que durante anos e mais anos, como um ônibus da cidade, traçou linhas em seus penamentos, e não se sabe se ela foi a "vontade" ou foi a "razão". Nem se sabe se ela existiu. Mas com certeza existiu. Assim como tudo que nos move e nos influencia existe.  E que talvez, inevitavelmente ele nunca a encontre, embora ela esteja lá, em algum lugar de seu universo platônico e poético. Esperando por um dia em que sonhará de novo a razão da sua alma purpurinada.

Vou lhes contar uma história, uma história para se lembrarem...