sábado, 21 de abril de 2012

A leste de um Sonho

Eu era uma montanha, um vale no norte de uma terra árida, porém eu era um oásis. Rios se encontravam em mim. Pássaros se alongavam sob meus ramos. Grilos embebiam meus galhos. Eu era a Califórnia. Cheia de brisa. Eu talvez viesse do mar, ou do deserto, mas em minha pele se escondia o sal. Almas passavam pelas minhas estradas. Olhos me cruzavam às intercessões. Minhas imensas ondas resplandeciam sem que ninguém tivesse coragem de socorrê-las. Eu era um andar de Steinbeck, um sonho de Hemingway. Eu era a dor das palavras imigrantes. O cheiro das sebes e a água dos cáctus. Eu era a turba dos jacarés. Os índios me respeitavam, e também os brancos, pois eu era tanto o ouro que jorrava pelas areias, quanto os caminhos que levavam ao leste. Meu barco se chamava poesia, e navegava num imenso cânion imerso em lágrimas da terra. Esta terra tão antiga, que não existe idioma que a descreva, apenas o passo dos andarilhos, e dos palhaços errantes, e as fogueiras dos viajantes, e os amores dos bisões de olhares doces e gladiadores.


E no meio disso tudo existiu a pena. Pois se eu era tudo isso. Você foi a maré baixa e a maré dos lagos ciprestes. Você foi pássaro alçando voo apesar da solidão das árvores. Se eu era  a Califórnia, você foi Nevada, com seus desertos imaginários e suas minas de urânio visitada por turistas, onde comprei um anel de cobre lindo, mas que tornou meu dedo musgo.  Foi a estrada da minha alma, reta e sem fim, como num conto de algum escritor sem esperança e repleto de névoas – o sonho jamais desvendado.  Você foi a intercessão de meus olhos suculentos e frágeis, perdidos numa estrada sem carros - Highway 66. Você foi o surfista mais maluco a descer a onda mais invulnerável de Waimea. E você sorria enquanto imigrante das palavras. As sebes dividiam suas águas, e seus cáctus eram jacarés do Nilo. Você foi o ouro vasto, que já roubado pelos espanhóis, não alimentava de sonhos  aventureiros, e que abandonou índios fluorescentes desde milhares de anos. Você foi a pele que descascou em Monterrey. Foi para o sul, e o caminho era o leste. Sua poesia era um barco, e navegou incólume por milênios um imenso deserto plano, ainda não moldado por cânions milionários. E esta descrição não atinge a imensidão de um idioma que a descreva, e que você foi. Passo de andarilhos, errantes palhaços , fogueira de viajantes... os bisões ainda gritam seu nome ao som de North Dakota.  Seus olhares doces e gladiadores carregam no fundo de suas pupilas milenares a história do que você fez.



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