sábado, 11 de fevereiro de 2012

Olhos Abertos

A madrugada é mágica. É por isso que eu acordo mais à noite. Reclamam de mim. Me chamam de vagabundo, de "desfusado", de "artista". Quando na verdade sou apenas uma estrela. Pequenina no fim do céu. Minha luz nem chegou aos seus olhos ainda. E quando chegar pode ser que naquele momento você olhe para baixo, como a procurar... e não me veja.

Quando eu era menino, eu adorava pistolas laser. Não que elas existissem. Mas existiam nos filmes, e eu amava as cores brilhantes, azuis, verdes, vermelhas... e imaginava que talvez, se alguma civilização mais avançada apontasse e atirasse para o céu, quem sabe não atiraria em nossa direção. Então eu prestava atenção no microlésimo de segundo que o raio do laser atingiria  a Terra. E assim eu teria a certeza de que algo estranho e certo havia acontecido. Eu seria, talvez, o único a ver o tiro aplacar o chão, perfurá-lo, e deixar uma marca alienígena no que é nosso. 

Foi por essas e outras que tantas vezes repeti em matemática, física, química... E sempre me chamavam de vagabundo, notívago, errado, um menino "desfusado" e com problemas. Aí me mandaram fazer um teste de Q.I pra ter certeza de que eu não era um débil mental e se foderam todos. Mas não vou tirar onda aqui, fodam-se.

Se você me perguntar o que é um copo, vou dizer que é um buraco. Se você me perguntar o que é comida, vou dizer que é remédio. Se você me perguntar o que é uma boate, vou dizer que é um lugar onde macacos pulam por não ter o que fazer em casa. Enxergo o Homem como uma dança do acasalamento. Um mosquito é um labirinto, e uma pedra é parte de um ser intransponível aos meus olhos. 

Passei minha vida em quimeras, e demorei a entender que eram quimeras porque eu ligava muito para o que os outros diziam, e eles ainda dizem que eu durmo tarde, que eu sou um morcego, que não estou sincronizado. Fazer o quê se minhas inspirações muitas vezes vêm quando vou deitar?

Hoje entendo a necessidade do mundo, e das pessoas da minha idade. Sei que não importa o passado. E aceito o meu erro, que foi ter mandado todo mundo à merda apenas pela metade. Sinto que não tenho mais tempo pra pajelanças nem babaquices. Espero que minha vida seja melhor que este texto introspectivo.

Mas sou um cara consciente. Sinto que adentramos um mundo viciado e viciante. Tenho a leve impressão de que a liberdade humana está sendo cerceada de forma sutil. Sinto uma pressão enorme quando penso em celulares, gadgets, cameras digitais espalhadas pela cidade, satélites filmando nossos piolhos, e um monte de baboseiras indumentárias para almas vazias. 

Às vezes tenho vontade de fugir para o campo, para bem longe. Para um lugar onde o mundo de hoje em dia não me alcance. Às vezes sinto saudades dos meus amores, ao mesmo tempo em que sou perseguido por falsos personagens em quadrinhos. 

Acho que Deus está de férias. Mas se por acaso ele estiver me ouvindo, peço que proteja os que me fazem bem. Que proteja este mundo de merda. Que proteja minha avó tão torturada, e meu avô tão mundano. Que vá com calma no apocalipse, seja lá qual for. Porque, por mais errado que eu tenha sido, eu apenas quis ser como aquela estrela que brilha fundo, anos luz de qualquer lugar. Solitária e vermelha, num canto da noite, possuo a madrugada nos meus olhos abertos.

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