Cambista de banco... pensava eu... Que diabos é um cambista de banco? Foi o que lhe perguntei, e ele logo respondeu, sem sorrir. "Eu chego no Banco do Brasil, peço à moça da entrada umas 20 senhas de atendimento no caixa. Ela já sabe do esquema. Eu dou a ela um troco depois. Aí, eu vou lá pra dentro, espero passar um tempo pra que as senhas já estejam quase na hora de serem chamadas, e monto minha "banquinha" num canto do banco. Muita gente até já sabe. Vendo cada senha por uns 5 reais para quem não tem saco de esperar na fila. Para quem está com muita pressa vendo até por 10 reais. É claro que o banco tem que estar bem cheio para que meu comércio funcione. E já fui expulso de algumas agências, e até banido, jurado de morte pelos seguranças etc. O senhor sabe quantos Bancos do Brasil existem na cidade?"
Pasmem. O moleque era um gênio. E bem naquele momento percorreu-me uma alegria que seguiu-se a um arrepio na espinha e um ventinho bobo no ouvido. Era o meu amigo ancião e barbudo, vulgo Sigmund, para os íntimos como eu, que aparecera para me dizer algo. Pedi um momento ao menino e fui à cozinha, pois é o que eu faço quando vejo Sigmund, geralmente, e estou em meu apartamento. Me pediu uma pêra, o Sigmund. Não entendi nada. Disse-me apenas que se a pêra tivesse sido a fruta proibida, a história de Deus teria sido diferente. Não entendi mesmo. Riu, uma risada cocainômana, e sumiu como nuvem.
Voltei para o sala onde atendia meu jovem paciente. Mal sentei em minha confortável poltrona de couro de bizão norte-americano, o menino começou a me revelar como havia perdido a virgindade naquele mesmo dia, de manhã. Naquele momento notei um certo constrangimento normal do garoto. E pensei como a sexualidade é realmente a coisa mais importante no ser humano, depois do dinheiro, é claro. Pois quem não tem dinheiro não pode ter nem sexualidade. E entendi o pensamento de Sigmundo sobre a maçã sendo substituída pela pêra. A pêra tem a ponta que a maçã não tem. E tudo que tem ponta é sexual. Uma bola perfeita serve apenas para se jogar futebol. Até os seios femininos necessitam de ponta. A ponta é símbolo da vida e da procriação, seja ela uma ponta passiva ou ativa, no caso, fálica. A ponta é o conflito do círculo, e... algo que eu ia dizer e realmente acabei de esquecer, uma pena...
Mas voltando ao meu jovem paciente, é incrível como um menino com tamanha cara-de-pau, capaz de comercializar senhas dentro de um banco, pode sentir mais vergonha ao comer uma mulher pela primeira vez. Claro que isso se deve à figura materna. O mundo é um círculo, assim como é a vida. A mãe é a ponta da pêra, é o que diferencia as pessoas umas das outras. Talvez por isso se use tanto a expressão "É a mãe! Mas chega de pensamentos parasitas. O menino interrompeu meu fluxo cerebral e começou a contar rapidamente a sua história - como forma de vencer a própria vingança de ter comido uma mulher pela primeira vez (É a mãe!). Mas achei interessante a história, porque começou a me contar onde foi, como foi que descobriu o lugar, quem o indicou, e que havia ido sozinho embora sua mãe tivesse alguma vez o alertado sobre o perigo de ser sequestrado e vendido como escravo branco em países da África (por que será que só as mães falam dessas coisas nestes momentos?). Bom, o menino chegou no puteiro, que era de quinta... Tocou a campainha, e foi logo atendido por uma mulher gorda com uma verruga no queixo e óculos de Woody Allen (ele de novo.. pensei eu). O menino ficou à espera da puta se refrescar e se aprontar. Quando entrou na cabine foi como se tivesse entrado numa câmara de gás. Seu coração, ainda coraçãozinho, pulava em vez de bater. A puta não era nem bonita nem feia, mas era fácil (coisa que logo no ínicio dos Tempos o Homem aprende a dar valor). Tiraram a roupa burocraticamente. Quando a puta deitou na esteira, fez assim com os braços na direção do menino e disse: "Vem, amorzinho." (Silêncio) O menino então respondeu de forma incrível e sucinta: "E os prolegômenos?" Nesta exata hora Sigmundo apareceu do meu lado e disse: "É gênio! mas não adianta tratá-lo, amigo, não tem cura, ele será advogado..."
Gerúndia, era a velha que eu tratava. Minha paciente. E o amor que eu sentia por Gerúndia engolia elefantes. E de repente vi um imenso prédio, de mais de 30 andares. E eu sabia que Gerúndia se encontrava no décimo quinto andar. E eu, papai noel (estava vestido como), possuía a missão de subir e entrar pela janela de Gerúndia levando na boca uma rosa e nas costas um saco cheio de sonhos. Este saco pesava muito, mas eu subia mesmo assim. Com minha avançada idade de uns 300 anos, e uma barba branca que às vezes agarrava em minhas botas de inverno, eu subia, e subia, e quase chegava no décimo quinto andar. E quando felizmente atingi o andar que me esperava, e botei as mãos na janela aberta, eis que a parte de cima cai em meus dedos, e com imensa dor me despenco de lá de cima do décimo quinto andar, com uma flor na boca e um saco de sonhos nas costas. Demoro um minuto apenas para atingir o chão, mas ao invés de atingi-lo, atinjo uma velha que carregava um guarda-chuva de florzinhas roxas. Esta velha era Gerúndia! Não sobreviveu ao choque, mas salvou minha vida, e assim eu pensei, por um momento que me salvara por amor, e não acidente. Mas não seria o amor uim acidente, de qualquer forma?
De qualquer forma, entrei em coma. Fiquei em estado catatônico por 10 dias sem poder atender meus pacientes. E nenhum deles apareceu para se consultar. Quando passou o efeito de meu coma, levantei e fui para a cozinha. Havia me dado vontade de comer um pão com manteiga e caviar. Lá estava Sigmund...
(continua...)
"É gênio, mas não adianta tratá-lo, amigo, ele será advogado..."
ResponderExcluirSeria parte da minha biografia??
E o caviar iraniano?
Fantástico!
Parabéns pela narrativa.
ResponderExcluirMuito bom! Continua...
ResponderExcluir