sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Tristesse

Choro porque só quem vive pode chorar
Sofro, porque só quem chora pode sofrer
Calo, porque na minha solidão
Só eu entendo, só eu falo e sei falar

Choro porque tenho olhos para chorar
Minhas lágrimas corrosivas de diesel
Minhas angústias locomotivas de carvão...
Olhos também foram feitos para chorar!

Apenas sinto! Entre lágrimas não se pode enxergar...
Sinto a dor do mundo no calcanhar
Minha pele é feita de calçamento.

Minha lágrima é de luar, choro e não sei me apagar
Derramo lágrimas que ao cair me abandonam
Semeiam a merda aonde, solitárias, brotam flores


À corda

Dorme, minha amada, dorme, que nada importa nesta caminhada
E se existe caminhada é porque existem passos a serem caminhados
E existindo passos, são estes, pelas flores carmesins,  gastos e trilhados
E se trilhados e gastos foram seus sonhos, imagine sua jornada!


Dorme, amor da minha vida, que sem vida eu não luto nem consigo
Dorme com vida, taciturna vida, porém bela como andes imersos
E se há inverno é porque há alguma gota de alegria num abrigo
E se há vestígio, há também de existir luz no mais triste dos versos


Dorme minha flor, que tudo que necessita é lama para crescer e florir
Lama, minha menina, chame tuas montanhas, corte seus livres anzóis
Lembre-se que em algum pasto há uma grama a teus atos sorrir


E lembre-se! Eu seguro sua mão sem a firmeza da minha própria...
Mas seguro! Seguro o leme das correntezas, embarcado e atando os nós
Dorme, querida.... E acorda! À corda! que a calmaria sempre nos apropria!


A Rosa do Deserto

Um homem caminhava. Um homem caminhava perdido. Um homem caminhava perdido num deserto. Um homem caminhava perdido num deserto em busca de uma flor. Um homem caminhava perdido num deserto. Um homem caminhava perdido num deserto em busca de uma flor que nunca aparecia.

Dias. Dias e dias se passaram. Dias e dias se passaram sem que ele avistasse algo. Dias e dias se passaram sem que ele avistasse algo além de areia e céu.

Sua visão adormecia. Sua visão adormecia enquanto seu estômago. Sua visão adormecia enquanto seu estômago já há muito dormente. Sua visão adormecia enquanto seu estômago já há muito dormente comia areia fingindo ser farofa.

Noites. Noites frias caíam sobre sua pele. Noites frias caíam sobre sua pele, que durante o dia, parecia não mais respirar .

E assim se passaram meses. E assim se passaram meses, e por um milagre divino. E assim se passaram meses e por um milagre divino seu corpo não mais precisava. E assim se passaram meses e por um milagre divino seu corpo não mais precisava de água nem de comida.

O deserto. O deserto incrível. O deserto incrivelmente o havia transformado. O deserto incrivelmente o havia transformado em um ser eterno.

Abriu-se. Abriu-se em seus olhos um sorriso. Abriu-se em seus olhos um sorriso de felicidade. Abriu-se em seus olhos um sorriso de felicidade ao constatar que a necessidade o havia transformado. Abriu-se em seus olhos um sorriso de felicidade ao constatar que a necessidade o havia transformado em pedra e areia.

Sentiu-se. Sentiu-se Rei. Sentiu-se Rei por saber-se imortal. Sentiu-se Rei por saber-se imortal mesmo significando nada mais que inócua pedra.

E no seu não necessitar da mais nada tornou-se. E no seu não necessitar da mais nada tornou-se, ou achou-se mágico. E no seu não necessitar da mais nada tornou-se, ou achou-se mágico e capaz de alterações múltiplas e dono dos domínios desérticos. Achou-se mágico e capaz de alterações múltiplas e dono dos domínios desérticos e poderoso de tudo, DEUS!

Um belo dia. Um belo dia, como todos no deserto. Um belo dia, como todos no deserto avistou. Um belo dia, como todos no deserto avistou uma miragem. Um belo dia, como todos no deserto avistou. Um belo dia, como todos no deserto avistou uma miragem - era a tal flor. A tal flor que procurava. A tal flor que procurava e já havia esquecido. A tal flor que procurava e já havia esquecido, não o havia esquecido.

Mas como DEUS que era. Como DEUS que era, não ligou para a tal flor. Não ligou para a tal flor e a desconsiderou. A desconsiderou acreditando sê-la uma miragem apenas.

Depois de tantos meses, anos... Depois de tantos meses, anos... de que valia. Depois de tantos meses, anos... de que valia, ainda mais agora que era DEUS. DEUS de pedra e areia, invulnerável à natureza, senhor do Deserto. Depois de tantos meses, anos...quantas rosas não poderia ter simplesmente ao desejar!

Sentou-se em chão esplêndido e chorou.

Um dia levantou-se e foi ver a tal rosa. Um dia levantou-se e foi ver a tal rosa que não estava mais lá. Um dia levantou-se e foi ver a tal rosa que não estava mais lá, mas olhando bem, encontrou um restinho de caule e uma corzinha mirrada devastada na areia.

Que tristeza. Que tristeza, a rosa não havia sido miragem. Que tristeza, a rosa não havia sido miragem e havia morrido, perecido, praticamente ao seu alcance, e de nada ele fez. De nada ele fez, era "DEUS" e não fez!

Pôs-se a rir! Pôs-se a rir como um palhaço de circo.Pôs-se a rir como um palhaço de circo chafurdado na lama da areia molhada. Lama da areia molhada pois havia chovido, uma vez,  após anos.

Riu tanto que não se dava mais conta de que era riso. Riu tanto que não se dava mais conta de que era riso humilde. Tanto que não se dava mais conta de que era riso humilde e que não era mais DEUS.

Após dois dias o Sol voltou. Após dois dias o Sol voltou a brilhar intensamente seus raios de fogo e glória. Seus raios de fogo e glória alimentaram o chão molhado. O chão molhado fez surgir um botão. Botão de rosa.

A rosa começara a crescer. Crescer e encorpar. Crescer e encorpar diante de "DEUS". "DEUS", ao contrário, ia se afundando, se mirrando, e virando flor moribunda.

                                                                            


* * * * * * * 

Quando apareci no lugar, acompanhado da legião estrangeira. Quando apareci no lugar, acompanhado da Legião Estrangeira.senti o que meus companheiros sentiram ao chegar. Senti o que meus companheiros sentiram ao chegar, e que é indizível e inenarrável, pois sentimentos não se explicam, e uma vez explicados perdem o sentido. O sentido.

Ao tocar a flor. Ao tocar a flor com minhas próprias mãos. E ao olhar para os lados e ver "DEUS" morto. "DEUS" morto como areia e pedra, voltei-me para minhas mãos.

A rosa não existia. A rosa não existia, era miragem. A rosa não existia, era miragem que fora verdadeira. A rosa não existia, era miragem que fora verdadeira um dia. Um dia antes de "DEUS" se achar DEUS.

E desvaneceu-se em meus olhos. Em meus olhos com tanta força, que ao olhar para os lados. Em meus olhos com tanta força, que ao olhar para os lados, noticiei a ausência de meus companheiros da Legião.

Estava eu só. Estava eu só, agora. Agora eu era areia e pedra. Pedra.

E foi depois disso. Foi depois disso que adquiri. Foi depois disso que adquiri a desordem que denomino. Denomino, por meu próprio e exclusivo conhecimento. Conhecimento de Repetição da Alma.

E assim vivo. E assim vivo repetindo a história de alguém. Alguém DEUS. Alguém DEUS que não acreditou na veracidade da miragem.

E portanto passarei a eternidade. Passarei a eternidade repetindo as palavras que me afligem. Quem achar, e ler este texto. Quem achar e ler este texto o entenderá como bem o quiser.

Até que algum dia chova.

Até que algum dia chova, e surja uma rosa para me salvar.



quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Simon

"Meu nome é Simon. Pronto, já me apresentei. Agora escreverei abaixo nesta carta, algumas linhas fundadas no maior dos desesperos. Lançarei esta carta aos oceanos, devidamente engarrafada e lacrada com uma rolha, e espero que alguma alma, bondosa, caridosa, ou não, a receba. Provavelmente de algum vento que saia de mim, ou de alguma louca correnteza, ou maré pungente e atracante. Portanto peço SOCORRO! Que Deus ilumine minha sorte através do caminho que esta carta fará. Deus me abençoe!

Sabem o que significa furacões? Furacões são tempestades cíclicas. São cíclicas tanto introspectivamente como externamente. Elas giram sobre si só, e giram também pelo mundo. Geralmente são tropicais e seguem um percurso norte/sul pelo Atlântico. Algum furacão provavelmente vai influenciar o itinerário desta pobre carta, sem saber que existe um outro furacão que se move. Este outro se move dentro de meu peito. Já arrancou todos os meus sentimentos. Deixou apenas a esperança, que diz o velho marinheiro: é a última que morre.

Não sei se algo morre na vida, especialmente a esperança. Mas sinto que tudo, quando ela não morre, vira um objeto. Pode ser um carro para alguns, como pode ser um cavalo, ou um bichinho de estimação para outros. E quem me dera ter pelo menos um bichinho de estimação para me fazer companhia neste calvário que é a longitude de um ponto pacífico se bem que no Atlântico Sul.

Voltando à esperança, ela pode representar muita coisa. Ou pelo menos pode se transmutar ao invés de perecer de vez. Uma coisa é também certa, a esperança depende de algo a mais. Ela sempre viaja acompanhada. Tirando um exemplo do meu mundinho: um navio tem o mar como esperança. Assim como um isqueiro tem o gás como esperança. Pois de que vale um isqueiro vazio? Da mesma forma um cinzeiro não faz sentido sem uma guimba de cigarro, mesmo que seja de um pirata ou de um capitão da coroa. Isso não importa realmente. Um cinzeiro solitário precisa e quer uma guimba qualquer. Não há fogo sem oxigênio - eis outro bom exemplo, Ah!

A minha esperança reside em várias coisas que precisam se manter e se cuidar para que no fim haja o resultado final, que é: eu ser salvo de qualquer maneira! Bom... o papel tem que chegar sequinho à destinação, senão como alguém poderá lê-lo em borrões? A garrafa tem que ser forte o suficiente para não se despedaçar num recife qualquer! E a rolha tem que aguentar a pressão do tempo e se manter intacta até o fim! Depois disso tudo há que se esperar que o vento guie esses indivíduos pelos caminhos corretos do acaso, e que por fim a garrafa encontre algum ponto no mapa, e que neste ponto exista algum humano, e que este perceba, com seus olhos, a garrafinha. Porque se depois de todo este trabalho de viagem, os indivíduos passarem despercebidos pelo olhar de quem interessa, no fim, tudo!.... tudo poderá estar perdido. Mas se no fim, tudo der certo e a garrafinha, com a rolhinha, com o papelzinho, que é esta carta, chegarem às mãos de algum delinquente frio que os jogue de novo ao mar, ou limpe os beiços com a carta depois de um jantar pelas ruas de alguma cidade fria e desonesta, e queime tudo pra fazer um cigarro, que vai precisar de um isqueiro, que vai precisar de gás, que vai precisar de um cinzeiro...  tudo estará perdido para mim. Pobre Simon...sempre a esperar, sempre a esperar...e agora mais ainda...a esperar...esperar...POR VOCÊ! SOCORRO!

Peço, para finalizar esta carta e tornar a leitura bem simples para quem interessar me resgatar daqui. EU NÃOAGUÊNTO MAIS! Por favor, se você abriu esta cartinha que conseguiu fazer a travessia fundamental, incólume de furacões, livre de redemoinhos e correntezas fugidias, por favor! Me salve! Pois eu não aguento mais esta solidão.

E para você, querido bem-feitor de minha vida, dou-lhe a minha exata localização. Fico na latitude 15 com longitude 30. Não terá como errar pois estou no meio do oceano de algum lugar e não aguento mais!  Estarei pronto e berrando e ateando fogo na única árvore que existe aqui, para que você me reconheça e me salve. Por favor...

Deus sê miraculoso e livrai-me desta solidão que não sustento mais...

A quem receber este manuscrito, muito obrigado do fundo de um coração, por favor, me ocupem logo!


Atenciosamente, eu aguardo...

Simon 'the island'"


* * *

Esta carta foi encontrada pela polícia de Porto Rico, num dia de Sol de fevereiro, mar calmo e carnaval. Os policiais bêbedos não acharam estranho uma carta dentro de uma garrafa fechada com uma rolha. Porém, devido ao álcool consumido, não se importaram, e acharam muito engraçado o seu remetente ser uma ilha.



domingo, 25 de setembro de 2011

O Fogo de cada um de nós.

Era o ano de 896 d.c.. Quando Elmrik soube que seu castelo no sul da Escócia seria invadido por seu primo John "o feio".  Sentiu se mal,  e um frio que subiu pelas suas entranhas atingiu sua cabeça, tal o medo do inimigo. Elmrik morreu literalmente de calafrio, e deu lugar ao seu sucessor, seu filho, Aldrich.

Aldrich ficou então incumbido de guarnecer e defender o seu castelo. Um castelo de porte médio, se comparado com o de seu inimigo John. Não apenas menor, além disso mais fraco e com uma população bem mais velha e despreparada.

Seus mensageiros comunicaram Aldrich que o inimigo se encaminhava com fúria e um grandioso exército de 1000 homens armados até os dentes, com o que havia de melhor naquela época em termos de tecnologia de guerra. Porém viria sem máquinas de guerra, pois dava a vitória como certa - e esta era mesmo certa. Portanto seu inimigo vinha pronto para invadir, pilhar, estuprar e tomar. Isso fazia parte do seu plano de se tornar o primeiro Rei escocês da História.

Aldrich viu logo que não havia chances frente ao tamanho exército dotado de armas de primeira linha e quantidade, pelo menos, com o dobro de guerreiros, perversos e com sede de sangue. Aldrich era bondoso. Não se metia muito em políticas, concedia passagem livre a outros exércitos pelas suas terras, e várias vezes havia cedido servas, das mais lindas, como forma de amolecer a fome de sangue de senhores feudais vizinhos. Mas Aldrich, apesar de fraco, não era burro, e bolou uma maneira de vencer a batalha iminente.

Mandou mensageiros espiões e sabia portanto que John "o feio" demoraria uma semana para movimentar seu grandioso exército através das colinas derrapantes da Escócia. Fez assim então. Ordenou que todo o vestuário desnecessário de seu povo fosse ajuntado, e que fosse colocado em pilha do lado do portão de entrada de seu castelo. Que apesar de pequeno possuía grandes e altas muralhas construídas por seu pai depois de uma invasão quase bem sucedida de outro primo - Jerome "o idiota".

Aldrich, ao mesmo tempo ordenou que um grupo grande de mulheres fosse comprar algodão nos vilarejos próximos, e que a razão dita fosse de vestuário novo para seu povo e servos. Demorou uns três dias para que todo o algodão existente no vilarejo acabasse e fosse transportado para o castelo.

É claro que John, "o feio", também possuía seus espiões, e logo tomou conhecimento deste incrível interesse por algodão. Mas imaginando uma vitória facilmente ganha, pensou que o primo estivesse louco, e pensando em fugir com o máximo de vestuário para o forte inverno escocês. Não estava de todo errado...

Aldrich ordenou então que o algodão fosse espalhado por completo por toda a área do castelo, e de forma uniforme. Faltava apenas um dia para o grande exército se aproximar. E já dava para sentir no ar o odor de sangue e ferro que caminhava junto a  este feroz exército, dotado de armas mirabolantes, importadas até dos Francos. Armas como machados de dupla face, que como poucos sabem, foram a tecnologia que mais contribuiu para o sucesso de Charlemagne em suas campanhas pelo continente.

Como todo castelo que se preze, existe uma saída estratégica devida apenas ao rei, e sua corte, em caso de fuga necessária. Aldrich ordenou o alargamento desta saída, porém sem dar alarde. Saída esta que não leva longe, (e nem havia tempo hábil para alongá-la). Mas tornou-a providencial e perfeita para que sua população se evadisse em tempo hábil.



O dia chegou!

Quando o exército de John "o feio" avistou de longe o castelo, se alinhou de forma tenebrosa, formando uma linha que, pelo vale, parecia não ter mais fim. Eram soldados e mercenários sujos e sebentos, vestidos de um cinza cor de chumbo e escudos avermelhados do sangue de outras batalhas. As barbas mal feitas e os dentes trincados e podres produziam faísca, e seus olhos fitavam o castelo como olhos de cobras prontos para dar o grande bote.

Como John sabia que o castelo se entregaria sem muitos esforços, não se preocupou muito com o cerco, e apenas manteve seu exército pronto para arrasar. Era costume deles estuprar as mulheres , matar as crianças, e empalar os vencidos, sendo que o medo que John infligia era tanto, que nem notava o que poderia acontecer.

Aldrich se manteve fechado em seu castelo por três dias consecutivos, não aparecendo nem nas torres. Isso levava John a uma ansiedade e fome de sangue ainda maiores. John babava!

No dia do ataque, ao romper da primeira trombeta mortífera, Aldrich ordenou uma fila, e com seu povo todo já dentro do castelo, bateu em retirada, pela saída de emergência, tomando o cuidado de fazer o menor barulho possível. Nem armas de ferro levaram. Porém deixou dentro do castelo dez homens de sua confiança colocados em pontos estratégicos e dispostos a tudo.

Quando a terceira trombeta tocou todo o exército de John atacou com fúria de Rei e carniceiro. John já se esbugalhava de ódio e vontade de morte; já não enxergava mais; seu raciocínio era o de derrubar o forte portão, entrar e matar. Demorou 20 minutos para que o forte portão cedesse e fosse ao chão de uma só vez..

Quando o exército de John, "o feio", finalmente adentrou os limites de Aldrich não conseguiu deixar de se surpreender. E com felicidade, John se sentiu maravilhoso em seu ego de futuro Rei, pois o inimigo, diante de tanta fúria , nem havia oferecido resistência.

Foi naquele momento que todo o estoque de uísque envelhecido, cheio de álcool, que Aldrich estocou e distribuiu, através de seus comparsas de confiança,  pegou fogo ateado ao algodão completamente embebido com a bebida. Ao mesmo tempo o portão era fechado por poucos de seu exército que haviam dado a volta e esperavam escondidos em moitas bem sigilosas. Também o portão de saída emergencial havia sido fechado e devidamente trancado por seus servos.

E para completar, a pilha de roupas colocadas ao lado do portão, desde o começo da história, se deslocou em chamas, caindo sobre o portão de saída do castelo e vedando mais ainda a saída da frente.

Desta forma o grande exército inimigo de John, "o feio", virou torresmo ao meio de gritos de terror. Só a fumaça matou metade do montante, antes mesmo que eles pudessem tentar escalar as torres de segurança. Os poucos que conseguiram se salvar foram devidamente mortos e despedaçados pelo pequeno exército de Aldrich, que esperava do lado de fora.

E assim termina esta metáfora. Mostrando que nosso cérebro é constantemente invadido por forças provenientes da vida. Egos, ansiedades, ódios diversos, inveja e vontade de ultrapassar os outros das formas mais vulgares nos tomam no cotidiano. Somos humanos e muitas vezes possuímos vontades imperfeitas. Alguns mais, outros menos, mas a areia que nos amálgama é , com certeza, a mesma.  Forças  negativas são muitas vezes mais fortes do que nós. E há apenas uma maneira de detê-las.

Tacando fogo nos exércitos malditos de nós mesmos. Com fogo, calma, discernimento, e inteligência interior.

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

A Casa de X.

E a fachada foi caiada. Toda fachada é "caiada" em algum momento. A vida é como uma casa. Possui porta, janelas, fundações. Nossos pais colocam a pedra fundamental, depois vão colocando tijolos, um a cada dia. Outros vão se juntando e contribuíndo com mais tijolos. Controi-se um piso. Que pode ser de mármore, ardósia, ou terra batida. Às vezes é de taco, que pode ser decorado ou triste. Mas o fato de ser decorado não significa felicidade. Talvez alguma alegria ao olhá-los. Não resta dúvida, mesmo assim soltam-se com o tempo, e o que há embaixo é a mesma e antiga terra de sempre.

Aos poucos a casa vai crescendo, se o sujeito tem muitas mãos que depositam os tijolinhos. Se não tem a casa fica miúda. Serve apenas para se entrar e sair. Não há espaço para divagações. Como se lhe falta-se alimentação a casa passa a ter limitações, pode não cair, mas encurta seus horizontes e não cresce. Quando a casa vai ficando grande é porque muita gente vai se metendo em sua construção. Dia vem, dia vai, há algum sujeito depositando seu tijolinho sobre a pá de cimento que vai estruturá-la para sempre. Ao estruturá-la vai prendê-la, limitá-la aos parâmetros arquitetônicos escolhidos por eles.

Toda casa é um obelisco. Toda casa é uma estátua de nossas vidas. Nossa própria escultura. E nossas vidas são casas erguidas como se pôde. Algumas têm tantos quartos e salas e janelas e banheiros e cozinhas que perde-se a noção de espaço, e perde-mo-nos  dentro delas. São divertidas para as crianças. Pode-se dormir cada dia em um quarto diferente, cada um pintado de uma cor. Mas a confusão é perigosa também. Casas podem ser labirintos de onde nunca se sai.


Às vezes a casa é mínima. Sua construção de vida apenas pôde proporcionar o básico, e muitas as vezes nem isso. Uma janela, uma cozinhazinha, um quartinho, e uma imensidão de possibilidades. Porque casas possuem estantes, e estantes são como lages. Existem lages vazias, tristes, mal-resolvidas, roubadas... e existem lages cheias, polpudas. Geralmente de livros, que sempre são tijolos, daqueles já desenhados, de concreto duro mesmo que não se desfaz com facilidade. E acabam moldando o interior da casa que é muito mais importante que o exterior, embora o exterior seja o "desenho" do quê se é.

Livros são tijolos secretos. São de vários modelos e cores e nem sempre são bons, mas geralmente são. Mostram que castelos podem ter tido uma história vazia, e que barracos muitas vezes são cheios. Mas não se enganem, barracos são sempre pobres, repletos ou não de estantes repletas também. Castelos são sempre harmoniosos, grandiosos, construídos por multidões de mãos, mãos muitas vezes desconhecidas. Mas também não se enganem, castelos podem ser vazios, e geralmente labirínticos, com saídas secretas que só quem pode se dar ao luxo de tê-las é quem necessita eventualmente fugir de sua realidade.



Mas o mais importante de tudo é a forma. Há os que podem, e contratam arquitetos, porém que garantias lhes dá a vida? Uma casa sempre acaba da maneira que não se imaginou. Sempre sobram vazamentos, telhas mal prendidas por fios de cobre frouxos. Há sempre uma privada que não era pra estar ali, e sim do outro lado do banheiro monumental. Aquele piso de mármore; descobriu-se depois que reage com a água e vai se corroendo com o tempo, embora isso não aconteça com o granito (que é diferente). Aquele piso de mármore "quase" de Carrara um dia vai produzir algum buraquinho que viram buracos, e que viram buracões. "Eu sabia que devia ter comprado uma torneira mais larga, essa é muito forte, e aliás descobri que gosto mais do prateado do que do dourado...um dia eu troco." A varanda dá pra uma vizinha muito feia e muito puta, e que atira um olhar de maldade sempre que se saí à varanda esquerda. "Como não pensamos nisso antes?" Como saber? A casa é dinãmica de fora para dentro também. Muito mais até do que de dentro para fora. E a puta da vizinha, durante a construção, aliciava os empreiteros e trabalhadores menores e acabava todo mundo indo para a polícia, depois dela tirar a roupa e acusá-los de assédio. Que resposabilidade pode ter um arquiteto, um engenheiro, quando a vida tira máscaras, sopra ventos que afrouxam fios de cobre,  e pode até destruir uma floresta maravilhosa bem do ladinho da casa, e colocar nela, bem em frente ao vidro da imensa sala, um monte de carros enfileirados e buzinando durante a  vida toda? Portanto castelos não são incólumes, nem barracos são pedestais.

E as casas que possuem corredores enormes e poucos quartos? O sujeito é criado para estar na cozinha e lembrar que precisa de um lápis para escrever a receita direito. Ele então anda quilômetros até chegar ao escritório que fica do lado de um dos dois quartos que restam. Quando chega lá ele procura e não acha o lápis no escritório, então segue a extensão deste imenso corredor até o último quarto da casa, que é onde ele põe a cabecinha no travesseiro toda a noite, e com certeza pensa antes de dormir, no que vai esquecer amanhã antes de ir ao trabalho. Por isso ele separa sempre tudinho numa valise que fica prontinha pra sair da casa bem cedinho. Mas todo dia quando ele está para bater a porta da sala, depois de andar um quilômetro de corredor, ele lembra que esqueceu o casaco na cadeira perto da cama, ou que não levou dinheiro suficiente, ou pior! Fica na dúvida se fechou mesmo a janela do quarto, o que o faz voltar corredores mais corredores de distância para no final descobrir que a janela estava realmente fechada. Agora, todo simples e corriqueiro dia de sua vida, quando ele estiver batendo a porta da frente, ele não terá como não se voltar atrás, andar pelo longuíssimo corredor apenas para constatar que o que ele buscava mesmo era algo que não existia. ("Será que eu existo?") Talvez por causa deste corredor contruído ao longo de sua vida, por inúmeras mãos zelosas, ou não, ele se deite um dia em sua cama, que fica no seu quarto de fim de corredor, e durma como quem dorme para sempre.


Mas a cidade cresce. Cresce porque mãos não cessam de colocar tijolinhos em casas próprias e alheias. E esse ciclo infinito faz com que sobre menos espaço, e em nossas vidas cada vez mais apertadas, cada vez mais truncadas e sem vista para o mar, constroem-se casas estreitas, porém com vários andares. Andares que vão subindo quanto mais você vive, pois esta é a história da argamassa e dos tijolos que fazem nossas vidas, e não a de simples casas comums, embora estas nunca sejam. Embora estas sempre sejam também as nossas vidas em algum momento. É parecido com a 'síndrome do corredor inacabável'. Só que desta vez ele segue através de escadas, para cima e para baixo, claro. Para cima e para baixo, num incessante movimentar de alma, onde no fim talvez o sujeito prefira rezar e se fincar como folha e raiz em uma cama. Se bem que uma boa vista possa ajudar. Às vezes para o bem; às vezes para o mal. Como tudo nestas vidas-casas.


Eu poderia passar minha vida inteira escrevendo sobre casas, tantos são os tipos, e tantos os resultados obtidos por mãos furtivas que roubam um tijolinho, e outras tão trabalhadoras que prezam tanto a ação e pouco o local onde a parede deve ser erguida. E paredes são realmente as aprisionadoras ou libertadoras de uma casa. Às vezes é melhor destruí-las, ampliar seus horizontes, poder andar de bicicleta pela sala, quarto e cozinha sem bater em nada. Porém, com certeza faltará lugar para se colocar livros. Porque a casa é sempre uma opção entre a liberdade e o emparedamento. Paredes são neurotransmissores abertos ou fechados. Por isso portas, na verdade só servem para enganar, já que são paredes de mentira. Mas até certo ponto, porque também são paredes que se abrem, e uma parede que se abre pode ser tudo na vida de alguém, ou melhor, na casa de alguém.

O fato e motivo importante mesmo deste texto eu espero chegar agora, porque senão sinto que terminarei em arranha-céus, e se isto acontecer terei escrito um romance. E como não desejo cansar ninguém devo ir direto ao ponto.

Nossas casas são indestrutíveis. Talvez não... mas com certeza inalugáveis. É imposivel se livrar dos seus próprios tijolos, que são pele. É possível derrubar suas paredes mais interiores, porém alguma restará! Pois somos o que há, e se nada mais há , foi por acidente, doença, ou vontade própria - o que é a pior coisa que se pode desejar para uma casa. Pois toda casa tem solução. Seja numa encosta de morro, seja num abismo se fundo, seja numa fazendinha no interior cercado de 'nada', seja embaralhada e espremida numa outra parede da cidade. Enquanto houver Terra embaixo existe a esperança em cima.

E assim como eu, que tive minha casa contruída de forma irregular, assim se sucedeu com a maioria das pessoas deste mundo. Mas depois da casa construída passamos a eternidade a tapar buracos. E existe a casa de X.


X é uma pessoa cuja casa foi muito bem construída, tijolinho por tijolinho, numa cidade com espaço para casas de qualidade. X teve problemas, é verdade, alguns tijolos não foram bem colocados. Mas quem é que não teve este tipo de problema?! Mas por algum capricho da vida bateu um vento, desses com carinha escura e sorrisinho de mau, que arremessou pedras nos entornos da casa de X, deixando-a coberta de marcas de buraco, e que também acabou influenciando a ordem interna de sua casa, muito bem servida de estantes e livros. Valendo lembrar que livros e muitas estantes nem sempre (e na maioria das vezes) são sinônimos de labirintos e só. Esta tempestade derrubou muitos livros, e estantes repletas, pesadas, construídas direto nos tijolos, e embutidas nas paredes. Paredes caíram, e ainda vão cair dentro desta casinha tão frágil, feita de delicadeza e visão.

Ao mesmo tempo que dói ver uma parede desabar dentro da sala, há que se sentir um certo conforto espacial inegável. Mas como a casa da gente é sempre a casa da gente, ou a gente num  arroubo de ousadia pinta as paredes de azul, ou simplesmente as cobre novamente de cal, tapando os buracos que sempre vão existir, apesar da cobertura. É decisão da gente o que fazemos de nossa casa-vida. Pois nem o sujeito dono de um corredor imenso está completamente entregue a ele. Transforme-o em tela de pintura! Em galeria de arte! Em estantes!!!! Não se deixe vencer por um corredor construído por mãos antigas e ignorantes, mal-intencionadas ou desastradas! Há sempre uma parede para se pintar de amarelo! Há sempre um chão de terra batida que pode ser coberto com carrara, mesmo que da 'vagabunda'!

É pena, que muitas vezes, na maioria das vezes... diz-se apenas: "As fachadas foram caiadas"...

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Caminhos

Ah! Meus caminhos...
Trilhei algum? Não sei...                                                        
São caminhos que nos trilham
Será que os trilhei?
Trilhei por escarpas da morte
Trilhei?
Por trilhas cobertas de folhas
Onde tristezas e sortes
Se escondiam -  trilhei?
Andei por versos inusitados
Todos dentro de mim
Trilhei-os trancados
Por palhaços querubins
Andei por tudo que andei
Labirintos de sonhos
Desertos que amei...
Caminhos são por si só caminhos
Seguem sem rumo ou lei
Caminhos são egocêntricos e independentes
Fui trilhado e não sei....?
Ah!... meus caminhos incoerentes....
Jamais saberei.






sábado, 17 de setembro de 2011

Solidão

Disse o poeta: "Solidão é lava...". Estava enganado. A solidão é uma deusa. É a deusa que atende pelo nome de Tristeza. Uma deusa guerreira em depressão. Seus momentos finais são os de uma guerreira caída no chão, pronta a ser sucumbida pelo inimigo. Seus braços são ornados de uma palha de ferro feita de vento, e do seu coração brota uma flor vermelha que pede piedade e só consegue o desprezo que a vai descolorindo até que atinja o cinza do seu horizonte.

Lava é algo quente, que esfria, mas antes te leva junto, te desintegra, e você vira parte dela. Parece a solidão, mas não é. Porque a solidão não te leva junto. Ela não te faz desaparecer, ela te mantém sábio e só. Não há nada mais triste e menos compreendido do que a sapiência solitária. Lava é o amor, que vem e vai. A Solidão vai além. A Solidão não vem e nem vai. Ela existe dentro de você como um vírus. Cujo único remédio é se entregar a ela ou se dar aos outros também solitários. O que causa um ciclo, uma corrente solitária inquebrantável, porque só sabe se dar quem tem para dar-se. O solitário muitas vezes não tem solução. Ele precisa de um salvador, porém se esquece que é quase impossível salvar uma deusa.


Interlúdio:
(Existe um bar sem nome
Ao qual chamo de Solidão
Na verdade não é bar
É um hotel de um beco na imensidão
De um bairro que já foi lugar
E agora é só um vão
Onde um espírito de ardósia
Deita suas mágoas em vão)



Continuou o poeta: "Solidão é lava que cobre tudo. (...)" Errou. A solidão não cobre nada. Você caminha sobre ela. E onde seus passos vão, onde quer que você pise, lá está ela, como uma sombra vertical. Ela não quer te cobrir, ela quer ser pisada, ela quer rir de você, sabendo que mesmo correndo ela te segue. Solidão é sincronia. E se você voasse? Não adiantaria nada, pois ela é parte de si. E lá está ela em baixo de você. E nunca do seu lado. E se existe um solitário ao seu lado você não vai saber. Pois a solidão é invisível e corrói seu pensamento e te diz pra ser feliz. Porque não pode revelar-se a sí mesmo. É feio. Assusta. Então seguimos nosso caminho, com a cabeça baixa, o olhar acinzentado dos que só enxergam o chão, esperando que uma mão nos reconheça.

Muitas mãos vão reconhecer. Mas de nada adianta uma fraca mão . Há sortudos que conseguem se aninhar entre muitas mãos fracas e assim fazer uma forte. Mas entre duas pessoas uma das mãos precisa ser forte. Precisa ter se livrado da Solidão. Mas então você me perguntaria: será que dois solitários juntos não passam a se tornar menos solitários? E eu respondo: depende da Solidão.


E assim sigo só...

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Sugarman


Estava eu agora abrindo uma velha bolsa bem grande de nylon, antiga com metade dos meus sonhos ainda rejuvenecidos, quando de repente começa a chover milagrosamente como nunca fazia em LA - Los Angeles. Nesta sacola reminiscências brutas em forma de fitas cassetes de uma época entre romântica e técnica que foram os anos 90.

Eu lembro que morava em Los Angeles, e acho que só. Hoje me parece tudo muito idealizado pela mente conturbada dos primeiros anos que voltei de lá, bem pior do que quando fui. Meu corpo doía todo, e parece, minha cabeça simplesmente apagou da memória fatos da minha história daqueles 5 anos que me parecem 10.

Recentemente comprei um gravador de fitas cassetes (pois o que eu usava lá, para compôr,  havia por fim quebrado). E depois de anos no Brasil (voltei já deve ter uns 12 anos...) resolvi abrir a sacola e desencavar pelo menos 50 fitas repletas de material esquecido e alguns que ainda lembro. Me deparei com uma fita que contém uma das minhas grandes músicas da época, porém onde canto não apenas com o violão, como era de costume, mas com uma banda inteira. (!!!) Eu juro que não me lembrava disso. E juro que puxo pelo cérebro, mas não consigo ter a menor ideia de quando a gravei, nem aonde, nem com quem. E nesse momento vejo como eu realmente não estava bem e não poderia nunca, apesar das críticas ambíguas providas do desconhecimento de pessoas que me amam, continuar minha jornada por aquele deserto da Califórnia. Tudo que sinto neste momento é um vazio no peito, que deve ser onde habita nosso cérebro, pois que a cabeça parece não valer nada. Como eu gostaria de me lembrar!!!!!! Mas a amnésia psicológica de um ser que não vivenciou grandes terremotos de placas teutônicas, apenas os seus próprios, parece que o partiu ao meio. Parece que esqueço para me lembrar do que gostaria que tivesse acontecido e não sucedeu. Ainda.

Me sinto só. Nesta noite de chuva de verão invernal a única coisa que me abraça são lembranças de magma. Se existe alguém mais solitário neste mundo, esta pessoa sou eu. Há anos ando por ruas escurecidas pela noite, e trilho labirintos de cidades infinitas como meus pensamentos, como LA.

E neste contexto resolvi contar a história da minha principal música. Sei que não farei outra igual (nunca fazemos), muito embora tenho feito melhores até. Nada para mim soa como SUGAR MAN. Com esta música eu experimentava a completa conjunção astrológica. Onde não existiam signos, nem zodíaco, apenas a solidão contida e captada dentro de cada um. Nos meus shows, na maioria das vezes desertos, embora eu me esforçasse tanto para que não o fossem. E era tão difícil que fosse diferente, já que na época mal se tinha um computador em casa, muito menos redes de relacionamentos, celulares, etc. Tenho a certeza de que hoje seria bem mais fácil. Mas que mesmo assim esta música arrancaria com dor, lágrimas dos olhos dos americanos céticos e pragmáticos que me assistiam, de vez em quando, nos bares e coffee shops de LA.

Lembro do "The Crooked Bar", do "The Highland Grounds", tanto que parecem que minhas lembranças são apenas fantasia. Ou que nada aconteceu, foi tudo um sonho acre-doce. Lembro do David, engenheiro de som e "dono" de um sarau, amigo meu também. Será que existiu? Ele que foi o primeiro a divulgar e adorar SUGAR MAN, mesmo com meu sotaque de "americano" de algum lugar indefinido por eles, já que meu sotaque eu fingia muito bem. Lembro das lágrimas de uma mulher que sempre me assistia e se debulhava em lágrimas com a tal música que tocava no que há de melhor e pior no ser humano. Não sei realmente o que esta música tem. Só sei como a fiz. E vou contar aqui como foi.

Eu morava em New Orleans, um ano antes de me mudar para a Califórnia. Frequentava uma faculdade e tinha poucos amigos, dentre eles um muito especial que era o Paulo. O Paulo morava numa cidadezinha que não cabe aqui, pois nem no mapa existe, chamada Houma. Um belo dia vi em algum lugar o anúncio de um concurso nacional de poesia. E me interessei. Numa das visitas ao Paulo eu rabisquei num guardanapo uma curta poesia meio surrealista.

"Where was the wind when i wanted to fly?
Where was the three when I wanted to hide?
There were some stones very close to the tracks
Close to the veil where you left me your time
Now there's no time, and so is the veil
Gone with this wind we're supposed to be flying
Watching the road, blanking a mind
Where am I? Have you seen a life?"


Era uma poesia bobinha, feita só pra eu tentar esse concurso desconhecido que prometia um grande prêmio. Bom, a poesia foi enviada ao tal concurso e foi esquecida no guardanapo. Depois de meses eu recebi um aviso de qualificação para as semi-finais. Fiquei feliz. Mais alguns meses recebi outro aviso de finalista. Nesta época eu já havia me mudado para Los Angeles, a cidade dos angeles. Lá eu recebi o aviso de que havia sido selecionado como um dos vencedores do concurso. Engraçado. Achei que vencedor de concurso de poesia só podia ser um, mas mesmo assim, na minha ingenuidade fiquei happy.

Bom, junto com a grande notícia vinha um oferecimento de um livro que eu poderia adquirir caso quisesse ver minha poesia publicada. Esse era o "grande" prêmio. Achei esquisito, mas minha curiosidade (burrice) foi maior e por fim resolvi comprar por correio, claro, o livro de vencedores. Passou um tempo e de surpresa chegou o livro. Era um livro com mais de 1000 vencedores. (!!!) Este foi, definitivamente o primeiro golpe 171 que sofri na minha vida. Depois vieram outros mais brabos, mas não vêm ao caso neste momento.

Esqueci. Continuei com minha vida meio deprê, meio produtiva, cursando uma escola de música, tocando onde podia, fazendo alguns amigos americanos, convivendo com meus pouquíssimos amigos brasileiros...
Até que um dia na frente da televisão da minha sala, assistindo sei lá o quê me veio uma inspiração para o começo de uma música, que falaria sobre um personagem, personificação, de todos os sentimentos humanos em crise de vazio e solidão. Um personagem que se confundiria com a própria vida. Uma mão à espera de uma mão. E me veio a ideia de que ele poderia ser doce, ser ingênuo, meio mendigo, meio revoltado, meu "grunge" da época. Mas visceral e humano confundindo-se com os passarinhos e necessitado da asas de outrem. Alguém que pudesse mentir por fome. E que sua mentira fosse indulgência.

SUGAR MAN foi o que me ocorreu, e eu a compus embalado por qualquer enlatado de televisão.

Mas não consegui passar da primeira parte. Pra quem entende de música só consegui fazer a parte A. E isso ainda era ideia, não chegava a ser música. Algumas semanas, horas, ou minutos, (minha mente perturbada não me deixa lembrar) compus a parte B da música, ainda na frente da televisão - me relaxava, e não existiam computadores muito disponíveis pra brincar. E assim a música estacionou. Não evoluía de jeito algum. Eu havia chegado ao seu fim, mas que não era um fim. A questão é que essa parte B não conseguia se amalgamar à parte A, e assim retornar felizmente ao fim da música. Quando isso acontece é uma droga. Porque às vezes há inspiração e às vezes não há. Como tudo na vida.

Foi quando eu lembrei do tal poema, feito uns dois anos antes pra um concurso enganador, que teve dois livros, comprados por mim e devidamente jogados no lixo do prédio. Mas eu conservei o guardanapo, e com a poesia do guardanapo eu encaixei a melhor parte da música, criando enfim uma parte C bem original e que levava perfeitamente de volta à parte A, finalizando de forma coerente a música.

Feliz concurso 171, pelo menos me deu uma música!

Comecei a tocá-la nos saraus de Los Angeles, que são muitos, e a música se destacou tanto que pessoas às vezes me chamavam de SUGAR MAN. E choravam. E isso sempre me emociona muito mais que o riso.

Um dia um professor da escola onde eu estudava música me convidou para palestrar na sua aula de composição. Ele queria que eu contasse às pessoas  o processo de criação desta música tão especial para ele. Foi um dos momentos mais tocantes de minha vida nos EUA. Pois primeiro ele me fez tocar a música para os alunos, que sentavam em roda de mim. E ao fim da performance este professor chorava como criança. E eu adoro fazer os outros chorarem nessas condições. Quando acabei, fui sabatinado pelos estudantes, que possuíam a minha idade no geral e eram alunos como eu. Lembro-me de dizer que a música levou 10 minutos  para ser completada, e que minutos depois uma menina dinamarquesa me perguntou quanto tempo eu demorei para fazê-la, no que eu disse "uns meses". Ela não entendeu nada e quis saber que contradição era essa: como poderia eu dizer que demorei 10 minutos pra compô-la e logo em seguida dizer que demorei meses! (???) Minha resposta foi. "Querida. Eu demorei anos para conseguir fazer a música em 10 minutos."

Enfim, demorei 12 anos para voltar a tocá-la de novo, tamanha é a dor e alegria que sinto nesta música.

Esta é a história da música, que composta por mim, mais me toca:  SUGAR MAN.





segunda-feira, 12 de setembro de 2011

O cansaço da rosa

Quando brilha a lua diamante
E os sonhos são de plástico rendados
Quando os olhos são finos e gaguejantes
E a Terra desliza por saltos-altos
A rosa salpicada arfa de cansaço...

Quando a ferida é maior que o braço
E as sardas ilhas inavegáveis
Quando a colcha de retalhos tem abraço
E o inferno secretamente conspira bondades
A rosa salpicada arfa de cansaço...

Há caminhos no ar, isso é seguro que há
E mendigos apanham de si mesmo em vão
Quando eu sinto que enxergo nada além de rosa
A Terra come pelos meus pés sem lentidão
E uma flor salpicada arfa de corajosa...




sexta-feira, 9 de setembro de 2011

A minha árvore ferida

No meu jardim, de frente pra minha casa, havia uma mangueira. Não lembro se fui eu que a plantei, mas a vi nascer e crescer. Deve ter pelo menos uns 20 anos. Já é uma árvore de verdade, vai crescer muito mais, pois mangueiras crescem mesmo.

Ela sempre foi uma planta linda, desde cedo, e nós sempre esperávamos por frutos maravilhosos, sem o agrotóxico do mundo, com a pureza de um jardim.

Bem na época em que ela começou a se tornar fértil a casa foi alugada para uma família de franceses, que vieram do exterior trabalhar no Brasil.

Esses franceses, típicos franceses, típicos europeus, maltrataram a árvore. Cortaram vários galhos importantes, já crescidos dela. (É preciso ser tropical para entender o sabor de uma manga madura.)

Ficaram na casa por uns três anos e voltaram à terra dos perfumes e dos esgotos. Ambos famosos.

Minha árvore nunca mais foi a mesma. Alijada de alguns braços importantes, cresceu com uma aura triste, um contorno quase que art-deco, uma forma introspectiva de árvore.

Por muitas vezes achamos que ela ia morrer. Ficou doente, tivemos que passar remédio em toda extensão de seu troco, e de seus braços mutilados. Pra aumentar o problema, uma outra árvore vizinha, de uma espécie predadora de árvores (pra quem não sabe, isso existe também entre as plantas), acho que se aproveitando da fraqueza da mangueirinha, quase a matou por baixo da terra. Nós arrancamos a árvore predadora, e não pensem que foi fácil não! Uma árvore assim não morre fácil.

Mesmo assim a nossa árvore continuou triste. E toda vez que passava por ela e via as pontas que sobraram dos galhos feridos me dava uma dor na alma. Cada vez que imaginava a dor da árvore sentia uma conexão maior entre planta e ser humano. A árvore passou anos dando poucos frutos. Depois passou a dar mais frutos. Por muito tempo suas mangas eram intragáveis, ruins para comer. Tinham uma cor mais ocre e um gosto de tristeza. Não era azedo nem amargo, era um gosto sem vida, sem graça, sem nada.

Passaram uns dois anos e a árvore já estava maior. Seus frutos já podiam ser comidos. Sua doçura já existia, provando que não há nada que o tempo não apague, cure, ou conserte. Mesmo assim, na pontinha final da fruta, bem perto do local onde ela se prendia ao galho, ainda se sentia um gosto ocre de azedume. Como um resquício da mágoa que serve pra nos lembrar que aquela árvore um dia foi aviltada de sua condição de planta frutífera. Machucada em seu caule, que também é pele.

O Homem é assim. Pisa em tudo que não consegue ver, quebra tudo que não possui a sua constituição física. E mata seu semelhante por prazer ou egoísmo. Não somos diferentes do resto. Não somos especiais. Se somos não fazemos jus à condição. Cortamos os braços dos nosso semelhantes, das nossas crianças. Quando não fisicamente, psicologicamente. Nosso mundo é supérfluo, nossa história criminosa. Somos tão irracionais quanto uma árvore, com uma diferença: elas purificam o ar, alimentam a terra, e estão aí há milhões de anos antes de nós. Enquanto que o Homem, se durar mais uns 200 anos, será uma vitória.

Aliás, a árvore cresceu cada vez mais, e melhor. Vai durar uns 200 anos.




terça-feira, 6 de setembro de 2011

Vida Após a Morte

Existe um lugar, mais comumente - um bar -, muito popular na zona sul do Rio de Janeiro que atende pelo nome de Empório. (Atende sim, se vocês ligarem pra lá vão ouvir alguém dizendo: - Empório!). Bom, é um bar feito numa típica casa da Ipanema antiga da época dos meus pais. Que fica na esquina do quarteirão da escola onde estudei, e que tanto odiei, e ainda odeio, e que um dia hei de explodir o local (claro que vou esperar as criancinhas saírem de dentro, né? Não sou muçulmano radical.). O Local que vou explodir é a escola e não o bar, só pra vocês terem ciência do que estou falando. Bom, o tal do Empório, na minha meninice, era um bar bobo, sem público, mais limpo do que hoje, e que possuía um "flipper" do tipo Arcade, que a gente descobriu, e ia jogar na saída da aula. Bem legal até. Nos fundos do bar tinha um papagaio, que não lembro se era de madeira ou de verdade mesmo, pois já faz um tempão isso, e eu tô ficando velho. Mas era um papagaio enigmático, como o próprio bar era. Entrei lá pouquíssimas vezes. Era um lugar de adultos.

O tempo passou e eu cresci seis anos a mais e já tomava minhas cervejas, e já virava minhas noites com alguns amigos, e já curtia o rock and roll local de uma forma passiva, porém inserida no contexto, e já começava a escrever minhas primeiras musiquinhas sem graça, as quais só não tinha vergonha de tocar para o meu espelho do banheiro de casa.  Empório vivia a sua melhor fase. Não era lotado, mas não era vazio. Havia se tornado "point" cultural do Rio de Janeiro. Destilava seus traficantes, suas musas, seus profetas, seus bêbados, sem a chatice dos adolescentes mais idiotas de hoje em dia (eramos um pouco menos). Gostávamos de Iron Maiden, The Clash, Ozzy, Beatles, e Blues. E o bar encarnou uma aura de templo do rock, de possuir o direito, bem como o dever, de ser o bastião, o Pirineu, o obelísco do Rock Nacional que corria solto na sua única época em que prestou mesmo, e única em que realmente existiu como movimento. O Empório era o lugar do rock, e sendo que na época o nem o rap, nem o Justin Bieber haviam nascido, nem a pirataria, nem  o I-Fode, e mal se tinha secretária eletrônica em casa, o Empório era a CASA do rock na cidade. Não enchia a rua, não atrapalhava o tráfego, mas agitava a vida.

Depois a casa se tornou "point" da molecada cada vez mais idiota (ou eu cada vez mais velho, talvez...). Mas não... porque até então eu só tinha 18 anos, e ainda deveria pertencer a idiotice geral, mas nessa época eu já tinha músicas, e já estava me mandando pra fora do Brasil, o que é outra estória que não vem ao caso neste texto. O Empório se tornou um bar mais esculhambado, não menos Rock and Roll, porém buraco das patricinhas chatas e gostosas  e dos mauricinhos e "pleybas" de plantão da época.

Já era o início dos anos 90 e o fim do rock nacional, dos anos 80, do meu período escolar, e acho até que do próprio papagaio, provavelmente. Mas um bar que mudou tanto e tão pouco, com relação à sua fachada arquitetônica, tinha uma característica peculiar, assim como poucos e sempre famosos, bares da cidade: o seu garçom especial. Figuras míticas presentes em vários bares do Rio de Janeiro, muitas vezes assumíam mais importância que o próprio espaço, e se reservavam até o direito a uma certa arrogância súbita. O Empório tinha o seu, e se chamava, e ainda se chama (pra quem acredita que um nome nunca morre, nem uma pessoa) Vicente.

O Vicente era o GARÇOM do Empório. Era a mística do lugar, a cara do lugar, o som do lugar, a imagem do lugar, com aquela sua barba de profeta-stones-metal, o Vicente era o "chefe" do lugar. Virou símbolo do lugar, e agora virou "amuleto" do lugar. Pois Vicente faleceu há pouquíssimo tempo, deixando órfãos os que o amavam, e os que o detestavam.

Agora, pergunto eu: qual a razão deste texto-embromação só para falar da morte de um garçom importante de um barzinho "cult" da cidade? Tudo isto era apenas para falar sobre a vida após a morte. Pois que o tal do Vicente foi um garçom importante e carismático, não resta dúvida. Mas apenas um garçom... nunca foi sócio, e aposto que nunca recebeu mais do que um salário de garçom, pelo que imagino... apesar da fama que tinha, e do sucesso do bar.

Pois que súbitamente, mas não sem aviso, o cara morre e de repente vai virar SÍMBOLO real da casa. Pois o Empório vai passar a se chamar "Empório Vincent"! E vai ostentar logotipo com o semblante do sujeito. Que honra....me dá vontade de chorar até. Até porque (e me perdoem os donos se eu estiver equivocado) o tal do Vincent não recebeu nem um tostão por isso, e provavelmente não receberá visto que está "dead". Ninguém nem deve ter perguntado a ele das intenções e transformá-lo no símbolo econômico, de um estabelecimento capitalista. Até porque duvido que alguém tenha tido a coragem de chegar para um bom sujeito, trabalhador, morrendo de câncer no fígado, dizendo as palavras: "Vicente, já que você vai morrer mesmo, que tal a gente usar seu nome (disfarçado jurídicamente de Vincent, claro!) e seu rostinho pra promover o bar que continará vivo?" Sacanagem, né? Quem tem culhão pra propor isso sem oferecer nada, pelo menos à família do doente? (Peço perdão de novo, caso isso tenha acontecido de maneira outra e justa.) Mas duvido, e me parece muito injusto que se aproveitem de quem nada pode mais reclamar. Tenho certeza de que o "Vincent" se sentiria honrado (ou talvez não?) com tamanha "vida" após a morte, porém muito chateado de não ter sido homenageado em vida mesmo. Principalmente com algum dinheirinho a mais, um numerariozinho a mais no contra-cheque, que com certeza não ia fazer falta para um garçom. Alguém perguntou a ele?

Pra não me ater apenas a este caso há outros famosos. Como por exemplo quando eu, embasbacado, assisti num show no Canecão, uma Zélia Duncan interpretar de sopetão, e anunciando, sua grande e feliz parceira, numa música composta entre ela e o centenário compositor pioneiro da música carioca - Guerra-Peixe. Música de Guerra-Peixe e letra da grande Zélia Duncan! (Ou não seria o contrário?) Porra! (Desculpem, mas só dá pra expressar isso com palavrão mesmo.) Alguém! Repito... Alguém perguntou ao Guerrinha se ele autorizava a Zélia a enfiar uma letra (boa ou não, que importância tem...?) na música dele? Alguém perguntou ao Guerra se ele gostava da Zélia? Seria impossível; não foram nem contemporâneos... Talvez a família tenha autorizado. Mas eu juro, que se no dia em que eu morrer, uma filha, ou neta ou raio-que-o-parta da minha futura família autorizar o uso da minha música Pintura (que eu adoro!) num comercial de Havaianas, eu vou puxar o pé de todo mundo durante a eternidade. Acho isso um desrespeito com o morto.

Isso aconteceu até com o John Lennon, que depois de assassinado teve uma música usada pra vender tênis Nike. A Nike é uma empresa que tem como política utilizar mão-de-obra semi escrava de países fodidos do oriente, e revendê-los a peso de ouro nos países onde existem povos mais endinheirados. (Um tênis de plástico e nylon a 500 reais!!!,  pra mim isso é peso de ouro sim.) Vocês, leitores amigos, que têm algum conhecimento das idéias do falecido John Lennon, acham mesmo que ele autorizaria tamanha audácia em vida? Bom... a Yoko autorizou, ou o editor da música, a gravadora, sei lá quem....

O pior dos casos: Igreja Católica Apostólica Romana. O Vincent deles, Jesus, morreu sem nem imaginar tamanha propaganda que faríam de seu nome durante mais de 2000 anos, sem falar na imensidão de dinheiro e terras e poder que isso gerou, dos quais ele não usufruiu nem uma vírgula. Com todo respeito a quem acredita em Jesus como Salvador, Messias, Profeta, etc. Não importa, né? Se você acha que ele é Deus então tudo bem, ele tá sabendo o que está acontecendo. Não parece muito feliz.... mas está sabendo. Agora... se você pertence a outra religião e acha que ele não teve nem idéia da amplitude que seu nome gerou e que o próprio nome recebeu, é uma tremenda de uma sacanagem com um morto. Quantos não enriqueceram se utilizando de uma pessoa que não está nem mais entre nós. Quantos não assumiram poderes inconcebíveis em nome de um personagem que se foi!

E você? Já pensou em você? Quando você morrer, (e isso é certo que vai acontecer, infelizmente...) o que vão fazer com VOCÊ? Você pode morrer e de repente virar o maior símbolo gay do universo sem nunca ter sido. Ou pode se transformar na maior marca de cerveja de todos os tempos sem nem ter experimentado um porrezinho da maldita latinha. Ou pode ser considerado o maior artista de sua época, e na verdade foi um merda  (nesse caso a coisa é bem legal). Mas considerando que em quaisquer das situações você não usufruirá de nada, não saberá de nada, não assistirá a nada, e que outros lucrarão sobre seu nome, dane-se tudo e todos , né?

Mas vamos considerar que existam realmente espíritos, e que possamos depois de mortos assistir a essa imensa orgia que fazem da gente. Impassíveis de tomar alguma providência maior que puxar pezinhos por aí, tudo isso é podre. Volto então ao caso do meu amigo Vincent, ops! Vicente. O sujeito vivo é perigoso. Pois ao ser homenageado desta forma tão bela, de virar cartão-postal e letreiro, pode receber melhor oferta e se mandar. E aí a casa, ou religião, ou empreendimento qualquer cai, né?. Melhor esperar o vivo morrer mesmo. Daí a vida após a morte.

sábado, 3 de setembro de 2011

Bailarina

Vi você surgir na noite branca
As mechas de seda, o corpo de louça
A luz das pupilas, as mãos vadias
Serpenteando fugidias pelas vistas.

Vi você surgir na noite louca
Alva bailarina do corpo de loura
Enquanto, sentadas em sedas atentas
Vistas serpenteavam fixas e tensas.

Viram-se de repente nuas
E foi quando eu a vi rodopiar
Do abismo do palco saltar
.
Abrindo seus braços como num aceno
E solta, tão solta, de repente arriscar
Um salto para dentro do mar